31.12.09

Balanço de 2009 (já que toda a gente faz eu também tenho direito a fazer um)

E 2009 acaba. Foi um ano complicado, mas parece-me que passou muito depressa. Não foi bem o que eu tinha planeado, mas até nem correu mal.
Tinha decidido que me iria esforçar e dedicar nas aulas e ter boas notas. Não me esforcei tanto quanto podia, as notas não foram tão boas quanto podiam ter sido.
Magoei-me, sofri, fui traída, perdi pessoas em quem achava que poderia confiar sempre. Mas fiz novos amigos e, acima de tudo, encontrei alguém que me faz verdadeiramente feliz.
2009 foi possivelmente o ano em que mais mudei. Não querendo soar convencida, foi o ano em que mais cresci. Comecei o ano como uma pessoa infeliz e resignada, que achava que as coisas nunca iriam mudar, que a sociedade iria ser sempre a mesma porcaria, e que eu não podia fazer nada em relação a isso. E acabo o ano a achar que a sociedade continua a ser uma porcaria, mas a saber que é assim porque existem pessoas como aquilo que eu era, que se resignam, que não fazem o mínimo esforço para mudar nada. Pode ser um esforço que não vale nada, mas faço-o. E o meu esforço é apenas um, podem existir muitos outros, e as coisas podem mudar (obrigado por me teres feito acreditar num futuro melhor, meu amor :) ).
Por exemplo, no início do ano eu não esperava que houvesse uma data possível para a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo. E agora há uma data para a discussão do assunto, e já não parece uma miragem, já parece possível.
Este ano valeu a pena. Teve bons e maus momentos, como sempre. Mas agora consigo pensar mais nos bons momentos. Ah sim, estava-me a esquecer, e consegui deixar de fumar :D (mais de dois meses sem tocar num cigarro).
Não sei como vai ser o próximo ano. Não vou fazer uma lista de coisas para cumprir. Tenho planos, claro: acabar a licenciatura, começar o mestrado, arranjar um trabalho em part-time, continuar a ser feliz :) Mas não importa. Vou-me esforçar para que seja bom, e é isso que interessa.

29.12.09

"Ó Maria, anda ver isto, que pouca vergonha, ai temos de experimentar."

Já aqui disse o quanto gosto da Inês Pedrosa. Mas tenho de voltar a dizer, porque mais uma vez uma crónica dela me pareceu simplesmente brilhante (apesar de já ter uns dias de atraso, acontece, contingências da vida).
Eles não se importavam com ninguém
"Até chamei a minha mulher para ver e da janela da minha casa assistia-se a tudo". O tudo a que se assistia era um casal de jovens dentro de um carro namorando com muita intensidade. "Eles não se largavam. A rapariga estava sem camisola e o rapaz estava com as calças para baixo. Eu e outras pessoas passámos junto ao carro, mas eles não se importavam com ninguém", explica o mesmo mirador, definido pelo "Diário de Notícias" do passado dia 10 de Dezembro como morador. Não foi por falta de esforço deste voyeur convicto que os namorados se mantiveram embrenhados um no outro, fora do mundo: o homem viu da janela, chamou a sua Maria para que partilhasse a entusiasmante visão - na esperança de que ela aprendesse alguma coisa? - , depois desceu à rua, rondou o carro, e nada. "Quem foi passando na rua ficou 'escandalizado' com o que viu, sobretudo por ser ainda de manhã, e chamaram a Polícia Municipal. A patrulha chegou ao local ainda a tempo de apanhar os jovens em flagrante delito", conclui o "DN". A notícia tem por título 'Casal apanhado a fazer sexo oral', e surge devidamente ilustrada com a fotografia de uma rua desabrida e a legenda "Foi neste local de Paredes que os jovens se entregaram ao sexo". Lembrei-me de um poema de Daniel Filipe que lia, relia e sublinhava nos meus tempos de liceu, sobre um homem e uma mulher que "inventaram o amor com carácter de urgência" e foram perseguidos por isso mesmo. Estes jovens vão responder em tribunal pelo crime de atentado ao pudor. Sobretudo por "ser ainda de manhã"? Se tivessem guardado os seus ardores para o cair da noite, seria o 'atentado' menos grave?

A expressão "moradores escandalizados" é várias vezes repetida ao longo da notícia. A mim, escandaliza-me a existência da notícia. Ou melhor: escandaliza-me que o centro da notícia seja o 'escândalo' declarado pelos moradores e não o 'escândalo' da condenação judicial dos jovens. Quantas pessoas fazem sexo dentro de automóveis - por não poderem fazê-lo em casa dos pais, por não terem dinheiro ou coragem para alugar um quarto de hotel ou porque, simplesmente, começam a beijar-se e não conseguem parar de se entregar um ao outro? Que mal vem daí ao mundo? O desejo, os beijos, os abraços, fazem mal a quem? Os 'moradores escandalizados' reagiriam do mesmo modo se vissem, dentro ou fora de um carro, um adulto espancar uma criança, um homem espancar uma mulher (ou vice-versa, mas é menos frequente) ou um grupo de jovens humilhar outro? Estas coisas acontecem diariamente e não vêm nos jornais, nem são alvo de processo judicial. Imagino a reacção dos pais da rapariga, lá em Paredes, a este processo. Imagino os castigos a que será submetida, já fora da alçada do flagrante delito.

Enquanto escrevo estas linhas passa num canal de televisão uma das muitas obras-primas de Clint Eastwood, "A Troca", filme inspirado na história verdadeira de uma mulher a quem desapareceu o filho e que a polícia interna num manicómio depois de lhe ter devolvido um rapazinho que não era o seu e arquivado o processo. Durante séculos as mulheres que se rebelavam contra as autoridades foram fechadas em hospícios, sujeitas a choques eléctricos - para as libertar da 'histeria' própria do seu sexo - e anuladas como seres humanos. Ainda acontece, em mais lugares do que supomos. A penalização doméstica e social da rapariga apanhada neste 'flagrante delito' será equivalente à do rapaz?
Entretanto, como é que eu faço para conseguir que a Polícia Municipal resolva os atentados ao pudor que me preocupam e escandalizam?

Escandaliza-me o desespero das pequenas empresas que chegam ao fim do ano sem conseguir pagar os salários aos seus funcionários porque os senhores que mandam ainda não tiveram tempo, dois meses depois das eleições, de delegar competências e fazer com que as contas dos serviços prestados sejam pagas. Escandaliza-me que os compromissos assumidos por um candidato político sejam esquecidos ou negados assim que toma o poder. Escandaliza-me o dinheiro público atirado à rua em festanças inconsequentes, em vez de investido nos instrumentos e símbolos maiores de educação e promoção do país. Estes flagrantes delitos que ocorrem à vista desarmada e à luz fria do sol de Dezembro, não escandalizam ninguém? Não interessam os jornais?

Eu também sou jovem, eu sei o que é desejar desesperadamente uma pessoa, e sim, eu já fiz coisas que meio mundo considera impróprias em lugares pouco adequados. E então? Sou pior pessoa por isso? Porque raio é que esta gentinha só se preocupa em ver os outros a fazer sexo, em vez de se meterem nas suas vidas? Isto a mim parece-me uma grandessíssima dor de cotovelo, e não é para menos, segundo os estudos de que ouço falar a vida sexual da maioria dos portugueses vai de mal a pior...

27.12.09

... haverá luz ao fundo do túnel algum dia? ...

E mais um dia sem luz, para juntar à lista. Vai-se vivendo da caridade dos outros, olha carrega-me a bateria do telemóvel se faz favor, coiss assim.
O que diz a EDP? Não temos previsões de quando será possível arranjar a avaria. Pois claro que não têm. Nunca têm previsões de coisa nenhuma, nunca sabem nada, nunca arranjam nada. Uma empresa com cobertura nacional, sem concorrência (não se pode comprar electricidade a mais nenhuma empresa), não tem técnicos para arranjar os estragos em digamos 15 concelhos. Imaginem se os estragos tivessem sido nos trezentos e muitos concelhos do país, ia ser lindo.
As meninas com voz melosa dizem-nos que temos de ser pacientes. Claro que temos. Temos de ser pacientes mesmo depois de a paciência se esgotar, e começarmos a imaginar coisas extremamente móbidas e violentas. Temos de ser pacientes até chegarem os técnicos da EDP, que vão ser linxados pela população enfurecida, depois de arranjarem a avaria (nós estamos irritados, não somos estúpidos ;) ). Estou a brincar. Acho eu.

26.12.09

É tão romântico viver como na Idade Média...

Eu sou uma pessoa razoavelmente paciente. Não muito, mas um bocado. O suficiente para nunca ter morto ninguém, por muito que as pessoas me irritem. Mas agora estou a pontos de matar alguém. Muita gente até.
E o que se passa é o seguinte: há,pelo menos, quatro dias que não tenho electricidade. Imaginem as vossas vidinhas, durante mais de quatro dias, sem electricidade. Sem luz, sem aquecedores (e está um frio do caraças), sem televisão, sem computador sem nada. Quatro dias a viver à luz de velas. É mau, é péssimo.
Isto mostra-me uma coisa: a incompetência da EDP. Houve muitos estragos, eu sei que sim. Mas eles não têm pessoas suficientes para reparar os estragos em 4 dias? Se não têm, caramba, porque raio é que eu lhes pago um balúrdio?
Já ultrapassei todos os limites da sanidade mental. Ando a imaginar atacar técnicos da EDP e espetá-los em postes de electricidade, coisas um bocado mórbidas. Mas pronto. Pode ser que isto se resolva algum dia.

23.12.09

Afinal o natal veio mesmo mais cedo, veio de antevéspera.

Estava lixada. Estava para lá de lixada. Passar a manhã a tratar de burocracia com a indescritível companhia do meu pai. Não podia estar mais lixada.
Mas depois a senhora da EDP começou a pôr notas de 50 em cima do balcão, e a dizer que era a devolução do que tinhamos pago a mais. E depois soube que até tinha tempo de ir dar nem que fosse só um beijo ao meu amor antes do natal. E o meu lixamento diminuiu um bocado.
Pode ser que a conta bancária não esteja em crise outra vez em Janeiro.

22.12.09

Pode ser que o mundo evolua. Assim devagarinho. Quase parado.

Duas notícas que vi esta manhã e compensaram um bocadinho o medo/nojo/pena que me provocam muitas outras notícias que vejo todos os dias:

Casamento homossexual: Discussão no Parlamento agendada para 08 de Janeiro

19.12.09

Às vezes o natal chega mais cedo, e olhem que eu nem gosto muito do natal

Hoje ao almoço comentava com a minha mãe uma notícia que saiu há uns tempos nos jornais, e que narrava algo como "a Igreja quer ver questão do casamento gay resolvida antes da visita do Papa" (resolvida para a Igreja quer dizer adiada por tempo indefinido, de preferência até que toda a gente esqueça o assunto e volte tudo a ser como o senhor jesus cristo manda; e nem vale a pena comentar o erro inacreditável que é a recorrente expressão casamento gay, por muito que levem nas orelhas muitos jornalistas preferem ser ignorantes eternamente). E a minha mãe perguntava-me o que raio tem a Igreja ou o Papa a ver com o assunto.
Não falamos de nós, porque ainda não é tempo disso. Ela sabe que eu sou homossexual e eu sei que ela sabe e, de alguma forma, cá nos vamos entendendo assim. Mas foi, sem dúvida, um dos meus melhores momentos dos últimos tempos ver a enorme indignação na cara da minha mãe ao dizer que todos os seres humanos têm o direito de fazer escolhas e casar com quem bem entenderem. São as pequenas coisas que nem tiram alguns pesos de cima.

Centenas morrem devido a crimes de ódio. Mas o que é que isso interessa? Temos é de nos preocupar com a crise.

Para quem diz que a homofobia não mata, ou pior, que não existe discriminação pela orientação sexual. Acordem para a vida.

18.12.09

Regulamento das bichas malucas de Portugal

Regulamento das Bichas Malucas de Portugal

Capítulo Primeiro
Natureza e sede

Artigo Primeiro
(Natureza)

1- Todas as bichas malucas são contra-natura, estatuto que lhes é conferido pela própria categoria de bichas.
2- Todas as bichas malucas possuem perturbações de ordem mental e psíquica, ou não fossem elas “malucas”.

Artigo Segundo
(Sede)

1- As bichas malucas deste país têm sede em casulos, vulgo armários do Ikea, que são bonitos e funcionais e fazem pandã com os cortinados.
2- Qualquer bicha maluca pode assumir cargos na função pública ou em entidades privadas, com excepção de posições de topo no CDS.

Capítulo Segundo
Características

Artigo Terceiro
(Características)

1- Uma bicha maluca terá como modelo máximo o Jack McFarland.
2- As bichas malucas são irrevogavelmente responsáveis pelos seguintes fenómenos:
aquecimento global
violência doméstica
alcoolismo
tabagismo
laicização do Estado
incompetência de governos socialistas
queda do muro de Berlim
exploração da Via Láctea
eventual declínio da Humanidade e consequente implosão do sistema solar.

Capítulo Terceiro
Casamento, direitos e funcionamento

Artigo Quarto
(Casamento)

1- Uma bicha maluca poderá contrair matrimónio com outra bicha maluca, desde que possua autorização prévia do Papa, como mandam os costumes de um bom Estado laico.
2- Qualquer casamento entre bichas malucas deverá incluir pelo menos um manto cor-de-rosa.
3- Em alternativa ao arroz tradicionalmente atirado às fronhas do casal recém-casado, o casamento entre bichas malucas deverá incluir uma actividade de arremesso de brilhantinas.

Artigo Quinto
(Direitos)

1- São direitos inalienáveis das bichas malucas os constantes dos seguintes pontos:
relações heterossexuais;
participação em programas de decoração de interiores;
outras actividades de carisma estrictamente heterossexual.
2- Todos os direitos serão regulados, em última instância, pelo PNR, podendo este pedir pareceres a um membro do CDS-PP que não tenha adquirido submarinos nos últimos dez anos.

Artigo Sexto
(Funcionamento)

1- Cada bicha maluca possuirá um penduricalho, doravante denominado “pénis”.
2- As relações entre duas ou mais bichas malucas implicarão a presença de um mínimo de dois “pénis” ou uma embalagem de seis salsichas.
3- Em qualquer circunstância, as relações profanas entre duas ou mais bichas malucas deverá ser antecedida por um Pai Nosso e um Avé Maria, respeitando com isso os princípios de igualdade de género.

Capítulo Quarto
Disposições finais

Artigo Sétimo
(Casos omissos)

Os casos omissos pelo presente Regulamento serão regulados, quando previstos, pela legislação em vigor, sem prejuízo de qualquer disposição anti-constitucional* que prevalecerá em todas as situações.

*Por disposição anti-constitucional entende-se qualquer parecer mentecapto que sugira uma “anti-constitucionalidade” do disposto neste regulamento, e que terá certamente toda uma base legalista e jurídica de acordo com J. B. G.

Isabel Sanches

CC – Some rights reserved. This work is licensed under a Creative Commons Attribution-Noncommercial-No Derivative Works 3.0 License.

Os meus mais sinceros parabéns à autora. Visto primeiro aqui, mas o original é daqui.

17.12.09

Se calhar não vai ser preciso um piaçaba, se calhar pode até ser um casamento

Não é muito. É pouco até, se tivermos em conta que isto nem deveria de ter de ser debatido ou aprovado. Mas é um princípio :)

13.12.09

"Há outras coisas na vida, muito mais importantes. A começar pelo amor."

Sempre gostei dos textos da Inês Pedrosa, sejam crónicas ou ficção. É uma mulher inteligente, lúcida, fervorosamente dedicada à cultura, e cujos textos de prosa ficcional me parecem quase poéticos. E agora fiquei a gostar mais um bocadinho dela.
Soube-me tão bem ler este texto, publicado a semana passada na revista Única, do Expresso, pareceu-me tão correcto em todos os seus pontos, uma opinião tão coincidente com a minha, que decidi transcrevê-lo na íntegra. Façam o favor de ler.

A converseta moralucha em torno do casamento dos homossexuais recorda-me aquele fulgurante poema de Sophia de Mello Breyner que começa assim: "As pessoas sensíveis não são capazes/ de matar galinhas/ porém são capazes/ de comer galinhas". Não se pode chamar debate ou discussão ao que é apenas um tricô de preconceitos, uma espiolhagem salivante sobre a vida íntima dos outros. Os homossexuais têm o mesmíssimo direito ao casamento que todas as outras pessoas, porque o contrato de casamento não se estabelece a partir do tipo de práticas sexuais dos que o contraem. A 'ideia' de que o casamento tem por objectivo a procriação, como afirma a dra. Manuela Ferreira Leite, não é confirmada pela lei de nenhum país democrático, talvez porque nem sequer se lhe pode chamar 'ideia': não passa de um fogacho de autoritarismo deslocado. O casamento não é fácil - e toda a gente sabe que não é a procriação o que o sustenta. Demasiadas vezes, pelo contrário, a mimosa prole estoira com essa relação de carne e alma entre dois adultos. Há gente para tudo, mas, em geral, o sexo não suporta a transfiguração dos amantes em papá e mamã.

O casamento é uma decisão extraordinariamente séria. Os heterossexuais tendem a esquecê-lo, porque podem casar e descasar sempre que lhes apetecer. Desde que procriem, segundo os fanáticos da procriação, não há problema. Mas basta olharmos à nossa volta para verificarmos que é exactamente esse o problema: o frenesim da procriação atenta contra os direitos dos procriados, aqueles a que na adolescência passamos a tratar por malcriados. As novas gerações crescem num hipermercado de mães e pais que mudam de mês a mês como as promoções especiais. O mais elementar bom senso confirmará que uma criança adoptada por um casal homossexual estável terá muito mais hipóteses de desenvolver as suas capacidades do que uma outra - e são tantas, basta abrir as revistas ditas cor-de-rosa para o confirmar - que viva de 'tio' em 'tio', de madrasta em madrasta, até à perda de referências final.

O bom senso só não nos pode meter isto pelos olhos dentro porque, em Portugal, o cenário de um casal homossexual com filhos é inexistente. Por causa da moral de esquina, hipócrita, opressora, da maioria amorfa. O lado esquerdo dessa maioria diz coisas como: "Eu não tenho nada contra a adopção por homossexuais, mas o problema é que a criança vai ser discriminada na escola". Estes são os mesmos que há trinta anos diziam: "Eu não sou racista, mas não gostava que o meu filho casasse com uma negra porque as crianças seriam discriminadas na escola". Agora abanam a cabeça, enervados, e dizem: "Não, não é a mesma coisa: porque a criança necessita de um modelo masculino e de um modelo feminno". Que modelos são esses, nesta fase de mutação acelerada em que as mulheres ganham autoridade e os homens doçura? Que modelos eram esses - o pai que bebia e batia, a mãe que apanhava e chorava? O pai que mandava, a mãe que obedecia? O centro dessa maioria diz: "Não sou contra os casais homossexuais, arranjem-lhes leis que os protejam, mas não lhe chamem casamento". Estes estão imbuídos de uma noção de superioridade: chamem-lhe outra coisa, para não atingirem essa coisa sublime a que só nós, os que fazemos o sexo do qual podem nascer bebés, temos direito. A direita dessa maioria diz simplesmente: "Vivam lá a vida deles, mas discretamente". Ou seja, às escondidas, como os senhores faziam filhos às criadas.

O mundo já caminhou o suficiente (no Ocidente, claro), para entender que as crianças precisam de adultos que as amem. Um homem e uma mulher. Ou só um homem. Ou só uma mulher - os filhos dos viúvos, como se criam sem o tal modelo outro? Ou dois homens. Ou duas mulheres. As crianças precisam de modelos de amor. O amor, qualquer amor, ilumina. Os que se amam devem ter o direito à partilha e à herança um do outro. Devem ter o direito a acompanhar-se na saúde e na doença, em casa e no hospital, até ao último suspiro. As pessoas que pretendem negar a outras pessoas o direito ao casamento, fundamentando essa recusa no tipo de práticas sexuais dos outros, estão certamente a precisar de tratamento psiquiátrico. Porque só pensam em sexo e em poder, e há outras coisas na vida, muito mais importantes. A começar pelo amor.


7.12.09

Cimeira de Copenhaga

Transcrevo na íntegra o editorial de hoje, publicado em parceria com 56 jornais de 44 países, no dia da abertura da Cimeira de Copenhaga.

Se não nos juntarmos para tomar uma acção decisiva, as alterações climáticas irão devastar o nosso planeta, e juntamente com ele a nossa prosperidade e a nossa segurança. Desde há uma geração que os perigos têm vindo a tornar-se evidentes. Agora, os factos já começaram a falar por si próprios: 11 dos últimos 14 anos foram os mais quentes desde que existem registos, a camada de gelo árctico está a derreter-se, e os elevados preços do petróleo e dos alimentos no ano passado permitiram-nos ter uma antevisão de futuras catástrofes.

Nas publicações científicas, a questão já não é se a culpa é dos seres humanos, mas sim quão pouco tempo ainda nos sobra para conseguirmos limitar os danos.

Mas, mesmo assim, até agora a resposta a nível mundial tem sido frouxa e sem grande convicção.

As alterações climáticas estão a ocorrer desde há séculos, têm consequências que durarão para sempre, e as nossas perspectivas de as limitarmos serão determinadas nas próximas duas semanas. Exortamos os representantes dos 192 países reunidos em Copenhaga a não hesitarem, a não caírem em disputas, a não se acusarem mutuamente, mas sim a resgatarem uma oportunidade do maior fracasso político das últimas décadas. Não deverá ser uma luta entre os países ricos e os países pobres, ou entre o Oriente e o Ocidente. O clima afecta-nos a todos, e deve ser solucionado por todos.

A ciência é complexa mas os factos são claros. O mundo precisa de dar passos em direcção a limitar o aumento de temperatura a apenas dois graus centígrados, um objectivo que exigirá que as emissões de gases a nível global alcancem o seu máximo e comecem a diminuir durante os próximos cinco a dez anos. Um aumento superior, na casa dos três ou quatro graus centígrados – a subida mais pequena que podemos realisticamente esperar se ficarmos pela inacção –, secaria os continentes, transformando terra arável em desertos. Metade de todas as espécies animais extinguir-se-ia, muitos milhões de pessoas ficariam desalojadas, nações inteiras afundar-se-iam no mar. A polémica sobre os e-mails de investigadores britânicos, sugerindo que eles terão tentado suprimir dados incómodos, tem agitado o ambiente mas não causou mossa na pilha de provas em que estas previsões se baseiam.

Poucos acreditam que Copenhaga ainda consiga produzir um acordo completamente definido – progressos efectivos em direcção a um tal acordo apenas se poderiam iniciar com a chegada do Presidente Barack Obama à Casa Branca e a inversão de anos de obstrução por parte dos Estados Unidos. Mesmo hoje, o mundo vê-se à mercê da política interna norte-americana, pois o Presidente não se pode comprometer com as acções necessárias até o Congresso fazer o mesmo.

Mas os políticos presentes em Copenhaga podem, e devem, chegar a um acordo sobre os elementos essenciais de uma solução justa e eficaz e, ainda mais importante, um calendário claro para a transformar num tratado. O encontro das Nações Unidas sobre alterações climáticas do próximo mês de Junho em Bona (Alemanha) deverá ser a data-limite. Segundo um dos negociadores: “Podemos ir a prolongamento, mas não nos podemos dar ao luxo de uma repetição do jogo.”

No centro do acordo deverá constar um arranjo entre os países ricos e os países em desenvolvimento, determinando como serão divididos os encargos da luta contra as alterações climáticas – e como iremos partilhar um recurso novo e precioso: os milhões de milhões de toneladas de gases de carbono que podemos emitir antes que o mercúrio dos termómetros alcance níveis perigosos.

As nações ricas gostam de fazer notar a verdade aritmética de que não poderá haver solução até que gigantes em desenvolvimento como a China tomem medidas mais radicais do que têm feito até agora. Mas os países ricos são responsáveis pela maioria dos gases de carbono acumulados na atmosfera – três quartos de todo o dióxido de carbono emitido desde 1850. São eles que agora devem dar o exemplo, e cada país desenvolvido deve comprometer-se com cortes maiores, que dentro de uma década reduzirão as suas emissões para substancialmente menos que o seu nível de 1990.

Os países em desenvolvimento podem argumentar que não foram eles que criaram a maior parte do problema, e também que as regiões mais pobres do globo serão as mais duramente atingidas. Mas vão cada vez mais contribuir para o aquecimento, e por isso devem comprometer-se com as suas próprias medidas significativas e quantificáveis. Apesar de ambos não terem chegado tão longe quanto alguns esperavam, os recentes compromissos de objectivos de emissões de gases dos maiores poluidores do mundo – os Estados Unidos e a China – constituíram passos importantes na direcção certa.

A justiça social exige que os países industrializados ponham a mão mais fundo nos seus bolsos e garantam verbas para ajudar os países mais pobres a adaptarem-se às mudanças climáticas, e tecnologias limpas que lhes permitam crescer a nível económico sem com isso aumentarem as suas emissões. A arquitectura de um futuro tratado deve também ser definida – com um rigoroso acompanhamento multilateral, compensações justas pela protecção de florestas, e uma aceitável taxa de “emissões exportadas”, de modo que o peso possa ser partilhado mais equitativamente entre os que produzem produtos poluentes e os que os consomem. E a equidade requer também que a carga colocada sobre determinados países desenvolvidos tenha em conta a sua capacidade para a suportar: por exemplo, novos membros da União Europeia, muitas vezes mais pobres do que a “Velha Europa”, não devem sofrer mais do que os seus parceiros mais ricos.

A transformação será dispendiosa, mas muito menos do que a conta que se pagou para salvar o sistema financeiro internacional – e ainda muito mais barata do que as consequências de não fazer nada.

Muitos de nós, particularmente nos países desenvolvidos, teremos que alterar os nossos estilos de vida. A época dos voos de avião que custam menos do que a viagem de táxi para o aeroporto está a chegar ao fim. Teremos que comprar, comer e viajar de forma mais inteligente. Teremos que pagar mais pela nossa energia, e usar menos dessa mesma energia.

Mas a mudança para uma sociedade com reduzidas emissões de gases de carbono alberga a perspectiva de mais oportunidades do que sacrifícios. Alguns países já reconheceram que aceitar as transformações pode trazer crescimento, empregos e melhor qualidade de vida. Os fluxos de capitais contam a sua própria história: em 2008, pela primeira vez foi investido mais dinheiro em formas de energia renováveis do que para produzir electricidade de combustíveis fósseis.

Abandonar o nosso “vício de carbono” dentro de poucas décadas irá exigir um feito de engenharia e inovação que iguale qualquer outro da nossa História. Mas se a viagem de um homem à Lua ou a cisão do átomo nasceram do conflito e da competição, a “corrida do carbono” que se aproxima deverá ser norteada por um esforço de colaboração, de forma a alcançarmos a salvação colectiva.

Superar as mudanças climáticas exigirá o triunfo do optimismo sobre o pessimismo, da visão a longo prazo sobre as vistas curtas, daquilo a que Abraham Lincoln chamou “os melhores anjos da nossa natureza”.

É dentro desse espírito que 56 jornais de todo o mundo se uniram sob este editorial. Se nós, com tão diferentes perspectivas nacionais e políticas, conseguimos concordar sobre o que deve ser feito, então certamente os nossos líderes também o conseguirão.

Os políticos em Copenhaga têm o poder de moldar a opinião da História sobre esta geração: uma geração que encontrou um desafio e esteve à altura dele, ou uma geração tão estúpida que viu a calamidade a chegar, mas não fez nada para a evitar. Imploramos-lhes que façam a escolha certa.

Esperemos que as pessoas que têm meios de fazer a diferença, os políticos, os governantes, tomem medidas e, principalmente, as apliquem. É tarde demais para salvar o planeta, mas é melhor conseguirmos fazê-lo sobreviver mais algum tempo, caso contrário arriscamo-nos a assistir ao seu fim.

5.12.09

Desafio

Recebi um desafio da Four Simple Words. Continuar umas frases, publicar um selo e passar o desafio a outras pessoas. Nesta última parte eu sou terrível, não tenho paciência para passar desafios. Mas agradeço a quem mo passou :P

a) Eu já... desisti de tentar entender as pessoas.
b) Eu nunca... andei de avião.
c) Eu sei... muito menos do que o que gostaria de saber.
d) Eu quero... fazer tanta coisa e não tenho tempo nenhum.
e) Eu sonho... viajar, ler e ter-te ao meu lado :)

1.12.09

1º de Dezembro

Hoje, 1º de Dezembro, comemora-se a restauração da independência de Portugal. Melhor dizendo, comemoram aqueles que nela acreditam. Não faço parte desse grupo.
A ideia do terrível domínio filipino e do heroísmo da restauração da independência, apesar de ter antecendentes, foi principalmente defendida e inculcada na sociedade durante o Estado Novo. O Estado pretendia mostrar a capacidade de sobrevivência dos portugueses, que se teriam revoltado contra a governação espanhola e restaurado o legítimo rei. Infelizmente isso é falso.
Não tenho jeito para me armar em José Hermano Saraiva e contrair tudo o que já foi dito sobre tudo da história. Mas neste caso a minha teoria tem bases documentais, pelo que me arrisco a dizer que é um bocadinho mais verdadeira que as outras.
Depois da morte dos herdeiros directos, o trono português ficou vago. E, por muito que não agrade a muita gente, o pretendente mais legítimo era Filipe II, rei de Espanha e dos Países Baixos. E era o mais legítimo porque a sua mãe, Isabel de Portugal, Imperatriz do Sacro Império Romano-Germânico, era portuguesa, nascida e criada no Paço Real de Lisboa, filha do rei D. Manuel I. E por acaso, se virmos bem, Filipe II de espanhol tinha pouco: a mãe era portuguesa, o pai era, tendo em conta as fronteiras políticas actuais, belga.
Mas mais ainda que a origem de Filipe II, importa a forma como governou. Portugal, entre 1581 e 1640, foi um estado autónomo, com istituições independentes de Espanha, mas governada pelo mesmo rei. Era o único ponto onde a administração se encontrava. E não pensem que os portugueses se mostraram muito indignados com a governação de um rei que não nascera em Portugal. Pelo contrário, aceitaram essa novidade sem grandes problemas.
A suposta restauração foi feita apenas por um grupo de nobres descontentes, que receberam o apoio popular porque qualquer movimento recebia o apoio popular (perdoem-me, mas é a verdade, os portugueses vão em tudo o que lhes digam para fazer).
Eu não tenho aquela ideia de que, se Portugal tivesse continuado sob a governação espanhola, hoje estaria melhor. Nem isso me preocupa. Mas acho que não devemos odiar os espanhóis por uma má interpretação da história.

Dia Mundial da Sida


Hoje assinala-se o Dia Mundial da Sida. Pensei em escrever comemora-se; mas uma coisa destas não se pode comemorar. E não percebo porque lhe chamam dia mundial da sida, deveria ser contra a sida.
Os primeiros casos de SIDA, Síndrome da Imunodeficiência Adquirida, que se desenvolve depois de contraído o Vírus da Imunodeficiência Humana, VIH, remontam a 1930, mas a doença começou a espalhar-se em grande nível na década de 80. Infelizmente foi durante muito tempo vista como uma doença de homossexuais, o que tem vindo a mudar devido aos números recentes de infecções, que mostram exactamente o contrário.
Infelizmente os números continuam a ser aterradores: em Portugal existem 35 mil casos de infecção conhecidos desde 1983; a nível mundial, já matou mais de 25 milhões de pessoas.
Não há forma de voltar atrás e impedir a existência da doença. Mas há formas de protecção, coisas tão simples, que podem evitar males tão grandes. Há que ajudar aqueles que já foram contaminados, e evitar, com gestos quase banais, que hajam novos contágios.

"O sino a tocar na torre da igreja fica bem, mas o muezzin a cantar no minarete já chateia"

Os partidos de extrema-direita da Suíça, que é um país democrático e livre, promoveram a realização de um referendo onde a população decidiu pela proibição ou não da construção de minaretes, que para quem não sabe são as torres das mesquitas, a partir das quais é feito o chamamento para a oração. As pessoas foram votar no referendo, porque a Suíça é um país livre e democrático, e ninguém é impedido de votar. E do referendo saiu a decisão de que não serão construídos mais minaretes na Suíça, porque a Suíça é um país democrático e livre, que não impede ninguém de escolher a sua fé, a sua religião e de o mostrar publicamente. Ah espera, afinal não. Porque proibiram. São democráticos mas proibiram. E vocês agora perguntam porquê. Pois, não era pelos muitos minaretes que tapavam a vista para as vaquinhas nos Alpes, porque existiam apenas 4, num total de 180 mesquitas no país. Não, foi mesmo por puro preconceito. As torres das igrejas não são proibidas, e existe uma a cada esquina, tanto lá como cá. Mas os minaretes, que eram quatro num país inteiro, foram proibidos.
Tenho muito medo daquilo em que a Europa se está a tornar. Tenho mesmo muito medo.

"Queguida, vou dague uma entguevista, a menina tem de legue, só vou dizegue coisas espeguetas"

Às vezes tenho a nítida sensação de ser uma pessoa bastante estúpida, porque leio ou ouço coisas e simplesmente não as entendo. Hoje aconteceu isso. Vi este título: D. Duarte favorável a figura legal para união de casais homossexuais , e sinceramente não entendi. Não consigo perceber o que raio é que o senhor Duarte (os monárquicos fanáticos podem exaltar-se à vontade, mas a monarquia acabou e eu não trato ninguém por Dom) tem a ver com o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
A notícia, felizmente, é curta, porque se fosse longa até me dava dores aguentar tanta parvoíce junta. Fiz o esforço de ler e o que é que eu vi? As ideias bacocas do costume. A primeira coisa que me faz comichões é dizerem que ele é "o herdeiro do trono português". E pior do que isso é o senhor acreditar realmente que é mesmo herdeiro. Ora bem, o senhor é primo em sexto grau do último rei de Portugal, que foi destronado vai fazer 100 anos. Para mim esta frase diz tudo. Ele não só é primo num grau tão afastado que eu nem sabia que existia, como se reivindica herdeiro de um trono que acabou há 100 anos. É preciso ser muito ceguinho para não ver que anda à caça de gambuzinos. Mas pronto.
Depois o senhor debita as tretas do costume, que o casamento é "um conceito que foi desenvolvido durante milhares de anos", que serve para "proteger os filhos" (eu adoro que digam isto e depois dêem de caras com milhares de casais neste país e no mundo que escolheram não ter filhos), parvoíces assim.
Isto tudo para chegar à conclusão de que "deveria haver uma outra figura legal". Podem casar-se, desde que não se chame casamento. E com isto voltamos à história do piaçaba, e ao meu sonho recorrente de pedir a minha namorada "em piaçaba". Ou em semáforo. Ou em vrrnhec. Tanto faz. Desde que não se chame casamento.
Eu gostava que esta gentinha que não tem, obviamente, nada para fazer, se metesse nas suas vidinhas tristes e resignadas e deixasse de tentar destruir a felicidade dos outros. Porque eu não fiz mal a ninguém para ter de viver num mundo onde não sou respeitada.