12.12.10

Revista Crítica de Ciências Sociais, nº76, Estudos queer: identidades, contextos e acção colectiva

Numa das muitas pesquisas que tenho feito para trabalhos do mestrado encontrei uma revista, Revista Crítica de Ciências Sociais, que tem a maioria dos números disponíveis em PDF. Um desses números é exclusivamente dedicado aos estudos queer, com textos de autores estrangeiros e também do ex-deputado Miguel Vale de Almeida (assunto a que voltarei um dia se tiver tempo). Fica a informação para quem se interessar por estes temas.

21.11.10

Não fazia ideia que o Atlântico Norte era tão grande que chegava à Grécia... e à República Checa... mas a República Checa nem tem mar!

Houve uma cimeira. Uma cimeira de uma organização chamada Organização do Tratado do Atlântico Norte, fundada no período da Guerra Fria com o objectivo de "manter os Russos fora, os Americanos dentro, e os Alemães em baixo". Ou seja, uma organização cujo nome não faz sentido, porque a grande maioria dos membros já não são sequer países do Atlântico, quanto mais norte, e cujo objectivo já não faz sentido, porque a Guerra Fria acabou há 20 anos. Eu, que nunca me calo, tenho de analisar os "prós" e os "contras" desta coisa. Vamos fazer ao contrário e começar pelos contras.

Contras:
- uma tolerância de ponto que envergonha qualquer pessoa com um mínimo de responsabilidade cívica;
- constrangimentos na circulação rodoviária e pedonal, assim como de transportes públicos, não só no local da dita cimeira como em outros locais da cidade;
- reposição temporária das fronteiras e consequente falha no Acordo de Schengen, que é só um dos documentos que faz a União Europeia ter sentido. Ou seja, nestes dias, a União Europeia teve um país a menos;
- compra de material militar extremamente importante para este acontecimento que, ups!, não chegou a tempo. Como se não fosse mais que comum atrasos em Portugal;
- recusa de entrada no país de pessoas que tinham, e cito, roupa preta. Sim, ter roupa preta era justificação para não entrar no país. Eu estava lixada, tinha de ficar em Espanha à espera que isto acabasse;
- detenção de manifestantes porque estavam, e esta é mesmo de rir à gargalhada, a manifestar-se. Foram presos porque estavam a manifestar-se. A maior parte dos detidos era espanhol. Cheira-me à antiga rivalidade luso-espanhola.

Prós:
- chefes de Estado vieram a Portugal. Espera, qual é a vantagem disto? Não trouxeram turistas, logo não há dinheiro. Não vieram comprar nada, logo não há dinheiro. Hum, pelos vistos terem vindo não serviu de muito;
- vieram arranjar um "conceito estratégico". Achei a frase bonita. Fui informar-me. A única coisa que fizeram foi arranjar um conceito que justificasse as invasões de países alheios que têm feito nos últimos anos. Ah, espera, pensei que vinham modernizar a organização, afinal só vieram justificar as mortes que têm causado.

Agora somamos prós e contras... O resultado não me parece grande coisa... Parece que isto foi só uma desculpa para o governo português se exibir, dizendo que estava a receber chefes de Estado importantíssimos e a fazer uma coisa importantíssima. Mas na verdade...

15.11.10

Trabalhar para o Estado é que é: sem ordenado, sem contrato, assim é que se quer!

Eu não me esqueci do Centenário da República, a 5 de Outubro, nem podia esquecer. E tinha feito planos para falar da importância histórica desse dia (assim como dos que o precederam e dos que se seguiram). Mas para falar do 5 de Outubro, tinha de falar da forma como a actual república tratou aqueles que para ela trabalharam no âmbito das comemorações. E a verdade é que tinha medo de falar e não receber o ordenado.

COMEMORAÇÕES DO CENTENÁRIO DA REPÚBLICA COM CONTRATAÇÕES ILEGAIS E PAGAMENTOS EM ATRASO

Contratos ilegais nas Comemorações do Centenário da República

Sim, isto é verdade. As exposições inauguraram no dia 23 de Julho, os contratos foram assinados com data de 15 de Outubro, e os recibos verdes passados com a mesma data. Durante 3 meses os guias não receberam um cêntimo, não tiveram forma de comprovar que estavam a trabalhar, não tiveram direitos nenhuns. Como se já não bastasse estar a trabalhar a recibos verdes, ou seja, não ter quaisquer garantias, esses recibos verdes nem sequer eram decentemente usados, e ver dinheiro a tempo e horas era mentira. Fomos falsos recibos verdes. Fomos forçados a cumprir horários, usar farda e trabalhar num posto determinado pelos coordenadores, o que contraria as regras mais básicas da prestação de serviços a recibos verdes. Fomos forçados a pagar do nosso bolso o seguro de acidentes de trabalho, sim, porque nem isso o Estado se digna a pagar. Mas não teve problema algum em pagar milhares de euros por construções mal feitas, grafismos mal feitos, em geral trabalhos mal feitos. Vejam no site do ajuste directo.


Eu vi o pagamento hoje. Hoje, dia 15 de Novembro! 4 meses depois de ter começado a trabalhar. E estive a pontos de achar que não iria ver pagamento nenhum. A Comissão Nacional para as Comemorações do Centenário da República tinha um orçamento de 10 milhões de euros, e foi incapaz de nos pagar a tempo e horas. É triste, muito triste mesmo, ver a forma como o Estado trata os seus trabalhadores. Como é que o Estado espera ser respeitado, se não respeita os seus próprios trabalhadores?
Ah, e a senhora Catarina Portas, que encheu a boca para dizer que os seus funcionários estavam a ser pagos, é uma mentirosa do pior, porque houve funcionários seus que só viram hoje o pagamento de há meses.

16.10.10

Possível extinção do Clube Safo

Foi-me dada a conhecer recentemente a situação em que se encontra o Clube Safo, de quem com certeza todos já ouviram falar, ainda que tenha sido pouco. Eu própria não sabia quais eram os objectivos e actividades dessa associação, mas uma rápida consulta na internet foi o suficiente para ficar a saber.
A situação é a seguinte: há cerca de 3 anos a direcção do Clube, por motivos vários, deixou de exercer, estando desde essa altura em gestão administrativa. Se até Março do próximo ano não aparecer uma lista que se candidate à direcção, o Clube será extinto.
Tendo em conta a importância que já teve no apoio a muitas mulheres devido à sua orientação sexual, mas também na participação no movimento de alteração de mentalidades que vem a ser feito na sociedade portuguesa, em especial nos últimos 10 anos, creio que esta associação não pode ser deixada ao abandono como está a acontecer. Porque apesar de ter havido uma vitória com a alteração da lei que permite o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, a verdade é que ainda existe um longo caminho a percorrer, que não pode ser feito sem a existência destes colectivos de apoio.
Venho por isso espalhar a informação, na esperança de que algumas pessoas possam unir-se no esforço de dar uma nova vida a esta associação. Se houver alguém interessado, que fique atento às informações que irão ser disponibilizadas no site da associação Clube Safo.

21.7.10

Publicidade institucional (e já agora, "puxando a brasa à minha sardinha"...)

Na próxima sexta-feira, dia 23 de Julho, pelas 17h30, vai ser inaugurada a exposição Corpo - Estado, Medicina e Sociedade no tempo da I República, integrada nas Comemorações para o Centenário da República. O tema abordado, como o próprio nome indica, é a medicina durante a I República, com especial ênfase para a visão tanto do Estado como da sociedade em relação a essa actividade. Faço aqui publicidade a este evento, não só por ser interessante a nível cultural para qualquer pessoa, mas também porque eu irei ser uma das guias da exposição.
A entrada é gratuita, localiza-se no Torreão Poente do Terreiro do Paço (do lado do Ministério da Agricultura), e está aberta todos os dias das 10h00 às 18h00. Excepcionalmente no dia da inauguração vai estar aberta até às 22h00; nos dias 5 e 12 de Agosto, em parceria com o Festival dos Oceanos, as exposições do Centenário da República estarão abertas até às 24h00.

Actualização: Na altura esqueci-me, mas não quero deixar de referir a exposição Viajar. Viajantes e turistas à descoberta de Portugal no tempo da I República, a decorrer no Torreão Nascente do Terreiro do Paço, com os mesmos horários que a anterior.

15.7.10

"Parece que até existem vários países no continente africano... Pensava que era só uma massa de gente esfomeada... E alguns até são ricos*!"

Sou uma pessoa extremamente complicada, muito exigente comigo e com os outros. Isso tem consequências, nem sempre boas, mas a minha persistência por vezes tem bons resultados. E uma das coisas que mais irritação me causa na sociedade actual é a incompetência e o laxismo. Se qualquer pessoa decide fazer qualquer coisa, seja ela boa ou má, então que a faça de forma competente e eficaz. Podemos ir ao exemplo mais radical: se queres ser um criminoso, e não estou aqui para julgar os valores ou princípios éticos, então que sejas um criminoso competente.
Este prólogo vem para explicar a minha opinião, de uma forma muito geral, sobre um caso particular, as atitudes nacionalistas, e mais precisamente, a música que foi utilizada como “hino” do Campeonato Mundial de Futebol de 2010, realizado na África do Sul. Faço já a minha declaração de interesses: sou anti-nacionalista, por princípio ético e ideologia política, seja o nacionalismo extremista xenófobo de “esses estrangeiros deviam era ir para a terra deles em vez de estar cá a roubar”, seja o nacionalismo de “todos os cidadãos têm de gostar da selecção nacional”. Mas reforço a ideia de que se deve ser competente em tudo o que se faz ou é, seja isso bom ou mau.
Depois de alguma pesquisa descobri que a música em questão foi, originalmente, uma marcha de homenagem aos soldados do exército dos Camarões que participaram na Segunda Guerra Mundial, chamada Zangaléwa, e também conhecida como Zamina mina, interpretada pelo grupo Golden Sounds, eles próprios membros do exército dos Camarões. Era cantada na língua fang, da África Central, e numa tradução muito mal feita podia ser vista como uma música de incentivo.
E o que é que a organização do Mundial decidiu fazer (aqui fiquei sem saber se esta decisão foi tomada pela organização da África do Sul ou pelo comité da FIFA)? Utilizar uma marcha do exército dos Camarões, mudar a letra para inglês (também existe uma versão em espanhol) e terminar com uma cantora colombiana. Onde é que encontramos a África do Sul aqui no meio? Não encontramos, porque infelizmente existe aquela visão paternalista que a grande maioria dos europeus e norte-americanos tem do continente africano: são um conjunto homogéneo de coitadinhos, caçadores recolectores que ainda vivem em cabanas e precisam de ser civilizados. Podemos representar a África do Sul, usando uma música dos Camarões, que são na outra ponta do continente, cantada em inglês, a língua do país que os dominou e humilhou durante séculos, e cantada por uma colombiana, que caiu ali do nada.
Tendo em conta o nacionalismo que existe na África do Sul, e que é muito forte, seja o nacionalismo dos indígenas africanos ou o nacionalismo dos afrikaners descendentes dos colonizadores mais tardios, seria de exigir, no mínimo, que fossem capazes de defender as raízes culturais do país em que vivem, ou seja, que fossem competentes até na pior das coisas.
* Apenas como exemplo, o PIB total da África do Sul é muito maior que o de Portugal, estando posicionados, a nível mundial, em 25º e 50º lugares, respectivamente.

1.7.10

"É que uma pessoa pode viver bem sem comer, agora sem a vinhaça e a cigarrada é que não!"

Hoje entram em vigor as alterações nos impostos. Também não me agrada muito, mas não é exactamente isso que me traz aqui. O que me leva a escrever foi ter visto há pouco uma entrevista de rua feita para o Jornal da Uma da TVI. O entrevistado era um senhor, na casa dos 50, a quem a jornalista perguntava, tendo em conta o aumento do IVA e a redução dos ordenados, em que produtos iria cortar para conseguir manter um orçamento mensal razoável. E sai a bela da resposta (cito de memória): "Bem, vou cortar na alimentação, no vestuário, e estou a pensar começar a cortar no tabaco."
Sou eu que ando a ver mal ou isto é de uma estupidez que nem tem descrição possível? Primeiro corta-se na alimentação, que é o mais essencial de tudo, depois no vestuário, que também tem alguma importância, apesar de ser muito menor, e só depois se reduz o consumo de tabaco, que, sejamos realistas, só serve para destruir o corpo, ter mau hálito ou incomodar os outros com o fumo e o cheiro?
Depois admiram-se que Portugal tenha das taxas de poupança mais baixas da Europa. E das taxas de mortalidade por cancro do pulmão mais altas.

29.6.10

"Estamos hablando de futebol, coño de um raio!"

Carlos Queirós descobriu a melhor forma de atacar os adversários: falar numa coisa que ele deve julgar que é castelhano, mas que na verdade é um idioma cientificamente preparado para causar dores atrozes a todos aqueles que têm um mínimo de respeito por línguas.
A arma revelou-se eficaz, havendo relatos de jornalistas espanhóis que caíram inanimados durante a conferência de imprensa; a FIFA está a avaliar a situação.

27.6.10

Como dizia o outro, prognósticos só depois do jogo

Devia ter escrito isto há uns dias, mas não tive vontade para isso.
Saiu a minha última nota, o que quer dizer que acabei o terceiro ano da licenciatura. Acabou. Três anos, três mil euros, muita coisa.
Não foi o que eu esperava. Tinha a ideia muito errada de um ambiente académico e sério, e dei de caras com uma versão maior de uma escola secundária. Mas acabei por me habituar e gostar.
Não me dediquei sempre como devia, aliás, não me dediquei quase nunca como devia, e isso traduziu-se numa média final apenas aceitável. O primeiro ano de aulas passou-me bastante ao lado, por desinteresse nas matérias e porque me dediquei demasiado a outras coisas (que se vieram a revelar infrutíferas). O segundo e o terceiro ano foram diferentes, em parte porque sentia mais interesse por aquilo que dava nas aulas, mas também porque tive um apoio enorme de alguém que conheci entretanto.
Aconteceu muita coisa. Vi pessoas desistir, seguir outros sonhos. Perdi colegas e amigos, outros safaram-se por pouco.
Foram anos complicados, muita coisa mudou. Eu mudei, enquanto aluna, enquanto pessoa, aprendi muito mais do que aquilo que ouvimos debitar nas aulas. Aprendi a pensar por mim própria, a fazer as minhas escolhas e tomar as minhas decisões. Aprendi a ser realmente eu.
Acima de tudo, cresci. E isso foi o melhor de tudo.

24.6.10

Petição contra o encerramento da Biblioteca Nacional

Durante os últimos dois anos a Biblioteca Nacional foi um dos meus locais de estudo, e o seu acervo foi a principal base dos meus trabalhos. No próximo ano iria ser, da mesma forma, o meu local de estudo, mas num momento diferente da minha vida, o mestrado. Em Outubro a Biblioteca vai começar o seu encerramento progressivo, para obras de remodelação, estando encerrada até Agosto de 2011.
Não me oponho de forma alguma a essas obras, são mais que necessárias. Oponho-me, isso sim, ao seu encerramento total, uma vez que parte das obras lá guardadas são exemplares únicos que não se encontram em mais nenhuma biblioteca pública do país, ou quando se encontram estão, em muitos casos, a 200 ou 300 kms. Tendo em conta que nem toda a gente tem a possibilidade de ir uma vez por mês ao Porto ou a Braga para consultar um livro, acho que seria mais correcto fazer um encerramento faseado, nunca fechando totalmente para não impossibilitar a consulta desses volumes, já para não falar da importantíssima secção de reservados, esses sim inexistentes em qualquer outro lugar.
Deixo aqui o link e o texto da petição contra o encerramento da Biblioteca Nacional, disponível na internet, e peço a todos que assinem, por tudo o que este encerramento acarreta.

No passado dia 8 de Junho de 2010 a direcção da Biblioteca Nacional de Portugal [BNP] anunciou que os serviços de Leitura Geral da Biblioteca encerrarão durante dez meses (de 15-11-2010 a 01-09-2011) e os Reservados durante cinco meses (01-04-2011 a 01-09-2011). Como cidadãos e utilizadores da BNP, embora conscientes das inequívocas vantagens inerentes à ampliação do edifício de depósitos da biblioteca, consideramos o planeamento dos trabalhos estipulado inaceitável e solicitamos que seja repensado.

O encerramento durante quase um ano de uma instituição que detém colecções sem alternativas (Secção de Reservados, espólios do Arquivo de Cultura Portuguesa Contemporânea, Secção de Periódicos por exemplo) é incompatível com o prosseguimento da actividade científica de largas dezenas de estudantes e investigadores que necessitam desse material.

A indisponibilização dos acervos da BNP comprometerá a viabilização de projectos em curso, muitos deles com financiamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior ou de outras instituições, e porá em causa o cumprimento de calendários e compromissos académicos estabelecidos. O encerramento de uma instituição como a Biblioteca Nacional teria, no mínimo, que ser publicamente comunicado com um ano de antecedência para que as várias partes envolvidas (universidades, instituições de financiamento, estudantes, investigadores) pudessem planear o seu trabalho em função desses dados. É inadmissível que uma determinação deste género seja comunicada apenas com cinco meses de antecedência.

Por outro lado, acreditamos que seja possível levar a cabo os trabalhos de transferência dos fundos de forma faseada, de modo a evitar um encerramento integral tão longo. Independentemente de existirem outras bibliotecas com Depósito Legal, é do conhecimento geral que para uma parte substancial do acervo bibliográfico e documental da BNP não existem alternativas nem em Lisboa nem em nenhuma outra biblioteca ou arquivo do país. Pelo que é absolutamente incompreensível que se proponha que este acervo único permaneça inacessível durante 10 meses.

Solicitamos pois que se proceda a uma reconsideração do plano de transferência, no sentido de:
1) se atrasar o encerramento da BNP para depois de Junho de 2011, para dar um mínimo de um ano de antecedência ao anúncio
2) fasear os trabalhos de modo a reduzir o tempo de encerramento integral dos referidos núcleos da BNP.

19.6.10

Marcha Orgulho LGBT 2010


E pronto, mais uma marcha que passou. Desta vez foi melhor, porque eramos mais, e porque além de lutar estávamos também a celebrar os direitos que hoje nos são garantidos. Mas falta muito, falta mudar leis, falta mudar mentalidades. Falta, como disse um dos representantes das associações presentes, termos orgulho todos os dias e não só uma vez por ano.

12.6.10

"Que horror, essas famílias degeneradas que são felizes e casam por amor e amam os filhos porque desejam e não por acidente, está tudo perdido!"

Já para aqui disse que gosto muito da Inês Pedrosa, tanto dos seus livros como as suas crónicas, que reflectem a sua opinião pessoal. E mais uma vez essa opinião pessoal é em quase tudo semelhante à minha, por isso aqui transcrevo o texto na íntegra:

O preconceito contra os homossexuais

E os poligâmicos? - perguntam, à falta de melhor, os preconceituosos.

A visita do Papa parece ter gerado em índoles esmorecidas a fantasia de que Portugal seria uma sucursal do Vaticano. O frenesim de intelectuais que matutavam se deviam ou não beijar a mão ao senhor (pergunta, afinal, desnecessária, que a mão papal é mais inacessível do que pode parecer), os ateus subitamente enlevados com a beleza do altar à beira-rio - tudo isso terá criado na Igreja Católica a tentação de comentar as leis da nação civil. Assim, D. José Policarpo apareceu a criticar a aprovação do diploma pelo Presidente da República, dizendo que se o Presidente tivesse usado o veto "ganhava as próximas eleições". Temos pois o cardeal-patriarca a exercer as funções de politólogo. E alguns sectores católicos da Direita tocaram a reunir para a vingança, procurando um candidato alternativo a Cavaco Silva. É tempo de lembrar algumas verdades cristãmente chãs a estes católicos alvoroçados: em primeiro lugar, a vingança é um acto feio e, em geral, de infaustos desenlaces (mesmo na vida terrena - porque em termos de vida eterna é um desastre); em segundo lugar, ninguém impede a Igreja Católica de proibir o sagrado matrimónio aos homossexuais: isso é uma questão que os homossexuais católicos terão de resolver consigo mesmos ou com a sua Igreja; em terceiro lugar, numa sociedade democrática e laica a vida privada de cada um é com cada qual, e não cabe ao Estado decidir a organização das famílias. E não, santas almas, a poligamia não colhe - para começo e fim de conversa, porque não é um sistema democrático.

O que choca uma parte dos católicos (porque nem todos são assim; há-os tolerantes e respeitadores do amor dos outros, independentemente de sexos) e também os sectores da sociedade mais agarrados ao cobertor da tradição é a possibilidade de se constituírem famílias em que os progenitores não correspondam aos convencionais papéis de pai e mãe. Como explica Teresa Pizarro Beleza no excelentíssimo prefácio ao livro de São José Almeida "Homossexuais no Estado Novo" (edição Sextante): "A habitualmente indiscutida complementaridade dos sexos feminino e masculino esconde mal uma diferenciação vertical, de primazia... e de autoridade. O casamento foi, até hoje, se excluirmos a prática da escravatura, a forma mais perfeita de domesticação e subordinação das mulheres". O estudo agora publicado sobre o "Homicídio Conjugal em Portugal", realizado por Elza Pais, conclui que a percentagem de cônjuges assassinados aumentou, na última década, mais de 40 por cento - sendo que as percentagem de mulheres que assassinam os maridos baixou em 5 por cento. Sabemos também que a grande maioria dos abusos sexuais acontecem dentro da família - designadamente, de pais sobre filhas ou filhos. Como é possível que saibamos tudo isto e continuemos a pensar na família tradicional como o paraíso na terra? Como é possível que saibamos tudo isto e continuemos a discriminar as pessoas em função da sua orientação sexual? Como é possível que pessoas que se arrogam defensoras de valores morais, acumulando a esses valores princípios políticos e económicos liberais, pretendam regulamentar a vida dos outros a partir das práticas sexuais? O amor não dirá nada a estes carnalíssimos espíritos?

No prefácio ao livro de São José Almeida - uma obra fundamental para percebermos os guetos para que foram empurrados os portugueses que se apaixonam por pessoas do mesmo sexo - escreve ainda Teresa Pizarro Beleza: "A seguir, dizem os alarmados cidadãos moralizadores, virá a adopção, a perfilhação, a filiação. Mas é claro que virá, isto é, por acaso até já veio. E porque não haveria de vir? Porque as crianças têm forçosamente de se habituar à hierarquia de género, à violência conjugal e à autoridade marital? Quem deu à Psicologia a autoridade científica para estar tão segura da bondade da tríade pai-mãe-filho? A enorme violência que as famílias 'normais' afinal albergam não fará as pessoas bem-intencionadas duvidar de tais arranjos sociais?". Como terão sobrevivido as crianças criadas por pais viúvos, ou por tias e avós, sem os tais "modelos" (e que modelos...) do feminino e do masculino? Será melhor que as crianças cresçam sem adultos aos quais possam chamar seus, numa instituição?

As crianças têm direito a saber de quem descendem biologicamente, claro - trata-se de uma evidência de mero bom-senso, até do ponto de vista da saúde. Mas essa é uma questão que se deve pôr para todas as adopções e inseminações: não colhe como argumento para excluir os homossexuais. Foi-lhes finalmente concedido o direito a assumir as suas famílias - que isso incomode outras famílias, ou possa ser considerado fracturante, eis o que não entendo..

Texto publicado na edição da Única de 5 de Junho de 2010

7.6.10

Venham moralistas e beatas, abomináveis homens das neves e isildas pegados, o que interessa é que somos felizes.

Hoje, Teresa Pires e Helena Paixão casaram. Dou-lhes os meus mais sinceros parabéns, pela coragem que tiveram de enfrentar uma sociedade que as discriminou, e mesmo assim lutarem por um amor que desejavam oficializar.

31.5.10

Para o mês acabar bem :)

Foi hoje publicada em Diário da República a Lei nº9/2010 de 31 de Maio, que permite o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, e que entrará em vigor dentro de 5 dias:


Artigo 1.º
Objecto
A presente lei permite o casamento civil entre pessoas
do mesmo sexo.
Foi difícil. Demorou décadas, mas finalmente a lei é (quase) igual para todos.


P.S.: hoje é também o Dia Mundial Contra o Tabaco. Eu fumei durante 5 anos, e deixei por vontade própria, e por vários motivos. Não sei ao certo porque é que comecei, possivelmente por motivos de aceitação social. Tenho consciência de que foi um erro, e de que só daqui a vários anos voltarei a ter uma saúde respiratória razoável. Mas se a vossa saúde não é o suficiente para vos fazer deixar de fumar, pensem que, segundo a sabedoria popular, beijar alguém que fuma é o mesmo que lamber um cinzeiro (a minha namorada diz que deve ser quase isso). Por isso, poupem a vossa cara metade a esse sofrimento.

17.5.10

17 de Maio de 2010. Um dia que vai ficar para a História :)

A partir de hoje sou uma pessoa mais feliz. A partir de hoje posso casar com a pessoa que amo. A partir de hoje passo a ser um ser humano com os mesmos direitos que os outros.

O Presidente lá esperneou, deu a sua opinião, mas promulgou. E é só isso que interessa.

Dia Internacional Contra a Homofobia

Para quem não sabe, hoje é o Dia Internacional Contra a Homofobia. Foi há precisamente 20 anos que a homossexualidade deixou de ser considerada uma doença pela Organização Mundial de Saúde. Só há 20 anos é que deixamos de ser tratados como doentes, desviados, loucos a precisar de tratamento. Há muita gente que acha que ainda precisamos, mas parece-me que são eles é que têm uns certos problemas, enfim...

Coincidência ou não, o Presidente da República fará uma declaração sobre o diploma da Assembleia da República que permite o casamento entre pessoas do mesmo sexo hoje, pelas 20:15 horas, no Palácio de Belém. Esperemos que as suas palavras sejam tão positivas como a dignidade deste dia merece.

E não menos importante, um dia que pode vir a ser memorável para a sociedade portuguesa, é já memorável para mim, por te ter ao meu lado há 13 meses. Obrigado por cada dia que passou, e por cada dia que virá. :)

11.5.10

Parece que se passa alguma coisa de estranho em Lisboa. Deve ser por o Benfica ter ganho o campeonato.

Ora vamos lá enumerar, visto que tolerâncias de ponto não chegam:

- polícias nas ruas e nas estações de metro, a ver as pessoas a passar;
- trânsito rodoviário e metro cortados durante o percurso do papa pelas ruas de Lisboa, e com falhas o resto do dia;
- estacionamento proibido ontem, hoje e amanhã, nas ruas que fazem parte do percurso do papa;
- ruas lavadas e desinfectadas (coisa que nunca tinha acontecido nesta cidade, por motivo algum, e que me parece uma falta de respeito para com os seus habitantes) no percurso do papa;
- caixotes do lixo retirados das ruas e caixotes do lixo das estações de metro selados (quem tiver lixo, que atire para o chão);
- autocarros da Carris (empresa do Estado) com bandeirinhas com o símbolo papal e com a frase "Carris saúda Bento XVI".

Alguém se recorda de coisas destas nas visitas de chefes de Estado como, deixa ver, Bill Clinton ou Vladimir Putin? O que é que Bento XVI é a mais que eles? Nada, pelo contrário, tem muito menos poder.
Alguém se recorda de coisas destas nas visitas de João Paulo II? O que é que Bento XVI é a mais que ele? Nada, pelo contrário, é muito menos admirado e acarinhado pela população.
Então, por favor, expliquem-me como é que se justifica tanta organização desnecessária.

18.4.10

Devia ter escrito isto ontem, mas andava demasiado ocupada a desesperar por causa de um certo vulcão (com quem ainda vou ter uma conversinha muito séria), e de qualquer forma não sou muito dada a lamechices.

525600 minutos. Te iubesc :)

16.4.10

Eyjafjallajoekull? Só mesmo uma coisa com esse nome para me chatear...

Como se não bastasse eu andar com o coração nas mãos por a minha namorada estar a coisa de 4200 kms de mim (a distância máxima a que tinhamos estado antes tinham sido uns 300 kms, e dentro de Portugal), agora há um vulcão islandês que decide explodir e lançar uma nuvem gigantesca de cinzas sobre a Europa. A última notícia que ouvi foi a de que os aeroportos do país em que ela está vão fechar amanhã.
Até o planeta me tenta dar cabo dos nervos!

13.4.10

E não só são os culpados da pedofilia de alguns padres, como também são culpados do sismo no Haiti e das cheias na Madeira. E do aquecimento global.

Eu achava que as coisas andavam demasiado calmas. Um silêncio no ar, tudo muito bem, é sempre sinal de que vem aí tempestade. E claro que tinha de vir:

É a homossexualidade e não o celibato dos padres que o secretário de Estado do Vaticano, cardeal Tarcisio Bertone, relaciona com a pedofilia e com os casos de abusos no seio da Igreja Católica.
"Muitos psicólogos e psiquiatras demonstraram que não há relação entre o celibato dos padres e a pedofilia, mas muitos outros demonstraram, e disseram-me recentemente, que há uma relação entre homossexualidade e pedofilia”, afirmou Bertone.

Pois, tinha que haver mais um tiro no pé. Primeiro dizem que a pedofilia é um assunto comum dentro das famílias e que devem ser elas a resolvê-lo, o que é só desculpar os milhões de casos de pedofilia que acontecem desde sempre. Depois dizem que a exposição dos casos de pedofilia por parte de alguns padres é um ataque à igreja e comparam-no ao sofrimento dos judeus. Depois, ainda, dizem que a culpa é dos ateus, que estão a destruir o mundo com a sua incapacidade de acreditar em coisas que não podem ser provadas. E agora isto.
Pois, os homossexuais devem ser todos uns pedófilos desbragados, sem noção de nada. Os homossexuais, que nunca foram maltratados nem vítimas de insultos e agressões. Os homossexuais, que nem andam há decadas a lutar para terem o direito mais básico que deveria ser garantido a todos os seres humanos, o direito à felicidade.
Claro, são sem dúvida os homossexuais os culpados disto tudo. Disto e de todos os males que acontecem à face do planeta.

7.4.10

E eu que achava que os livros da Margarida Rebelo Pinto eram maus...

Aqui me confesso: eu li o Crepúsculo, primeiro volume da saga Luz e Escuridão. Li, mas não achei nada de especial. Ainda tentei ler o Lua Nova, mas não consegui, estava a tornar-se demasiado mau. A autora podia até ter arranjado o melhor enredo do mundo, mas a escrever como se fosse um miúdo do 2º ano não vai longe (basta recordar as longas páginas que ela gasta só para descrever os peitorais, inexistentes, diga-se de passagem, do protagonista).
Depois disso veio tudo o que era possível sobre vampiros: contos, contos de autores portugueses, romances, ensaios, livros de gastronomia vampírica, talvez. O coitado do Dráculo do Bram Stoker deve andar aos tombos no túmulo, de dor.
E quando eu pensava que não podia existir nada mais degradante, eis que:



Viagens na minha terra com vampiros!! Sim, o livro de Almeida Garret, que deviamos ler na escola, mas em versão vampiro sanguinário apaixonado por rapariga frágil! Por favor, digam que isto é só um pesadelo. Como é que é possível chegar tão baixo? Tenho pena, tenho quase vergonha, da literatura que se faz neste país.

30.3.10

"Não se pode isto, não se pode aquilo, ai a moral e os bons costumes. Mas afinal parece que somos os piores."

Eu não sou católica, apesar de ser baptizada. Não sou, e acho que nunca fui. Não tenho fé em qualquer deus, e ponho em causa a sua existência. Sou agnóstica ateísta, para arranjar um rótulo. Mas admiro muito as pessoas que têm fé, seja ela qual for; invejo-as mesmo.
Mas nunca consegui entender a parte material, seja da Igreja Católica, seja de outras. O porquê da existência de uma hierarquia, de locais de culto tão luxuosos, o porquê de fortunas enormes, de poder institucional e financeiro tão grande que nem se sabe a sua total dimensão. Se é a fé que salva, então para que é que serva a riqueza?
E depois há tudo o resto. Os séculos de maus tratos e tortura a quem não partilhava as mesmas convicções. A Inquisição, o domínio do homem sobre a mulher, a defesa dos ideais da pobreza, do sofrimento, da dor. Perdoem-me, mas eu acho que toda a gente devia ser feliz.
E agora vem a público o que já se sabia há tantos anos. Eu sempre ouvi falar de padres que tinham um especial gosto por crianças pequenas. Nunca conheci casos pessoalmente, mas tenho a sensação de que era algo socialmente aceite. Agora as denúncias sucedem-se, tanto no estrangeiro como em Portugal.
Qual seria a melhor atitude a tomar pela instituição? Na minha humilde opinião, pedir desculpa. Pedir muitas desculpas por todo o mal que fizeram a essas crianças. Pedir desculpa por terem encoberto milhares de crimes de abuso sexual. Mas o que é que a instituição decidiu fazer? Dizer que se trata de uma conspiração para tirar poder ao Papa e à Igreja. Melhor ainda, o cardeal português José Saraiva Martins, que é só um dos membros da Igreja com mais poder, diz o seguinte: "É um pretexto para atacar a Igreja. Não devemos ficar demasiado escandalizados se alguns bispos sabiam e mantiveram o segredo. É isso que acontece em todas as famílias. Não se lava a roupa suja em público". Com que então não devemos ficar escandalizados perante o encobrimento de milheres de abusos sexuais. Não devemos ficar escandalizados perante o sofrimento infligido a milhares de crianças, muitas com graves problemas financeiros, que dependiam totalmente da Igreja Católica.
Esta instituição espera ser respeitada. Espera que a sociedade civil acate as suas ordens como se fossem cordeirinhos, em assuntos tão importantes como o uso do preservativo, o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, a emancipação da mulher. Mas esta instituição nunca respeitou ninguém, nem parece estar agora a começar a fazê-lo.

8.3.10

Dia da Internacional da Mulher (ou, devo dizer, o único dia em que as mulheres são seres humanos)

Tenho percebido, nos últimos tempos, que lido mal com a chamada discriminação positiva. Entendo que em parte seja necessária, que o seu objectivo é, em última análise, a igualdade, mas pretender lutar pela igualdade implementando desigualdade deixa-me reticente.
O que me leva ao assunto da discriminação positiva é o dia que hoje se celebra. Hoje, 8 de março, é Dia Internacional da Mulher. Não me vou dar ao trabalho de dissertar sobre a história desse dia, nem tudo o que lhe está associado. O essencial é que o objectivo deste dia era recordar todo o sofrimento pelo qual as mulheres passaram e passam, e tudo aquilo que já conseguiram conquistar. Eu entendo isso. Mas, sendo assim, há um dia para a mulher, e os restantes 364 do ano são para o homem. Neste dia, tal como em outros que actualmente são quase exclusivamente comerciais ( dia dos namorados, dia da mãe, etc), as pessoas fazem um esforço, dão uma flor, são simpáticas, e amanhã voltam a ser as mesmas bestas de sempre.
Durante um dia, num ano inteiro, a sociedade lembra-se que as mulheres já sofreram horrores pelo simples facto de nascerem mulheres. Que hoje, no século XXI, as mulheres continuam a não receber salários de acordo com as suas funções, mas sempre mais baixos que os dos homens com as mesmas capacidades, que continuam a ser rejeitadas para cargos para os quais têm completa competência, simplesmente porque não mulheres. Durante um dia, 24 horas, a sociedade lembra-se disso. E depois esquece, e volta a cometer os mesmos erros, os mesmos maus tratos, a mesma discriminação, dia após dia.
Por isso, e por muito mais, eu não gosto do dia da mulher, e não sou, nem serei melhor pessoa nesse dia, do que sou nos restantes dias do ano.

25.2.10

Although everything they might say, I will still marry you

Este é o centésimo post. Podia fazer um texto enorme. Falar sobre muitas coisas que me incomodam, no mundo, nas pessoas. Mas, como a frase popular, uma imagem vale mais que mil palavras.





(clicar na imagem para ver melhor)

21.2.10

Parece que há umas famílias melhores que as outras, uns seres humanos melhores que os outros...

Eu pensei em pôr só o link, mas depois achei que este texto valia cada palavra que a autora escreveu. Por isso, na íntegra, aqui fica.


"O problema é que já não somos coitadinhos

Esta história das veemência de opinião dos que dizem defender a família tem-me feito alguma confusão. Eu percebo que haja formas diferentes de pensar e de sentir as coisas, mas não compreendia a veemência e até o desespero com que muitas pessoas defendiam a exclusividade de direitos a uma certa casta, a deles, claro.

A resposta não me bateu de repente, foi uma coisa que foi crescendo, e que se passou comigo há uns anos. Eu explico.

Grávida de muitos meses mudei-me para a província. Fica a 40Km de Lisboa, mas é Portugal profundo na mesma. Ora, aquela malta, estava fartinha de conhecer mães solteiras (que era o meu caso). Não lhes fazia confusão nenhuma que eu estivesse grávida, sendo solteira, o que lhes fazia muita confusão, era eu não ser coitadinha. Mãe solteira sim, mãe solteira por opção já não percebiam. A minha opção tirava-lhes a oportunidade de poderem ter pena de mim, na sua superioridade moral. Não era a gravidez que lhes colidia com o sistema, era a opção.

Nesta história das "famílias a sério", eu acho que é isso que se passa. Foi retirada a esta gente a possibilidade de se sentirem superiormente morais, porque os outros, que antigamente eram coitadinhos, agora já não são e, heresia, até querem os mesmos direitos e deveres. Então, se querem os mesmos direitos e deveres, nós já não podemos ser superiores. Vai-se-nos o último reduto de superioridade, o moral (que o financeiro e o social já foram há muito tempo).

E é isto que lhes estamos a tirar, ao não sermos coitadinhos, ao não pedirmos desculpa por sermos mães solteiras, pais solteiros, com orientação sexual a, b ou c, estamos a tirar-lhes a possibilidade de se sentirem superiores, moralmente superiores. É o último bastião.

Daí a veemência. Coitaditos."

19.2.10

If we give gay people equal rights, then everyone will want them.

Eu pensava que depois de ser aprovado em votação na Assembleia da República e na especialidade, o assunto do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo deixava de me causar úlceras. Afinal não.
Pelos vistos uns senhores e umas senhoras com problemas de homofobia disfarçada vão fazer uma manifestação contra a alteração da lei, defendendo que "o casamento é entre um Homem e uma Mulher" (com evidente direito do homem para bater na mulher sempre que o Benfica perder; esta época a situação tem estado favorável para as mulheres).
Mas há mais! Pelos vistos uns militares que pouco fazem por este país que, diga-se de passagem, não precisa de exército para coisíssima nenhuma, acham que devem meter o bedelho onde não são chamados e vá de fazer uma espécie de mini-petição, uma carta aberta, na qual afirmam que o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo é "uma aberração" e que a sua intervenção nesta questão é "comparável ao 25 de Abril". Ora vamos analisar: o 25 de Abril foi uma revolução militar que acabou com 48 anos de ditadura, durante os quais Portugal foi um país completamente fechado ao exterior, sem liberdade de expressão, sem liberdade de impressa, sem direito a defesa em caso de julgamento, em que os cidadãos eram perseguidos pela polícia política do Estado, e em último caso condenados a penas de prisão longas em prisões sem as mínimas condições, como o Tarrafal; a alteração da lei que legaliza o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo pretende acabar com uma discriminação que existe desde sempre, que põe em causa a felicidade de milhares de pessoas, ou seja, pretende dar direitos iguais a todos os cidadãos. Estão a ver aqui os pontos em comum? Eu também não.

Ps.: a título de curiosidade, à mesma hora dessa infeliz manifestação, vai ser feita uma contra-manifestação, com o nome genial de "Bichas pela Liberdade".

14.2.10

Invictus

"Out of the night that covers me,
Black as the pit from pole to pole,
I thank whatever gods may be
For my unconquerable soul.


In the fell clutch of circumstance
I have not winced nor cried aloud.
Under the bludgeonings of chance
My head is bloody, but unbowed.

Beyond this place of wrath and tears
Looms but the Horror of the shade,
And yet the menace of the years
Finds and shall find me unafraid.

It matters not how strait the gate,
How charged with punishments the scroll,
I am the master of my fate:
I am the captain of my soul.
"

William Ernest Henley, Book of Verses

10.2.10

Um dia de cada vez

Cheguei a casa e vi a notícia de que o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo foi aprovado na especialidade sem alterações. E o dia ficou ainda melhor do que já estava a ser. Eu sei que o artigo sobre a adopção traz problemas, eu gostava que não houvesse impedimentos, que os direitos fossem totais. Mas isto é mais um passo para a frente, em vez de um recuo.

Na mesma altura vi este vídeo, de uma nova campanha da ILGA. E gostei.

8.2.10

"Então não é que o tipo que mora no 3º esquerdo disse ao telefone que a Manuela Ferreira Leite era uma bruxa?*

*(continuação do título) Vamos já meter-lhe um processo em cima, e publicar as escutas num jornal, e dar-lhe um excerto de porrada, e mais alguma coisa que eu me lembrar a seguir."

Quando se falava em mudar a lei para legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, insurgiam-se os conservadores (e a população portuguesa que pouco pensa e vai atrás daquilo que ouve), dizendo que tinhamos assuntos mais importantes com os quais nos preocupar, que a economia estava mal, o desemprego para aqui, o défice para ali, tudo coisas importantes, sem dúvida. A lei foi mudada, não houve nenhuma catástrofe por causa disso.
Agora, os mesmos conservadores esquecem que há défice e desemprego e coisas assim, para vir clamar pela "morte" (forma resumida de demissão e humilhação pública) do primeiro-ministro, porque foi apanhado numa escuta que não lhe era dirigida, e que foi considerada ilegal pelo presidente do Supremo Tribunal de Justiça. Desdobram-se em inquéritos, comissões, petições, tudo e mais alguma coisa, para ouvir conversas de outras pessoas, que foram consideradas ilegais por aquela que é, só, a figura mais alta do sistema judicial português, e que, quer queiram quer não, tem competências para tomar aquela decisão. Porquê? Porque não lhes agrada que o primeiro-ministro não seja linchado em via pública, porque são de outro partido, porque não têm a mínima moral.
Quando se tratava de dar direitos a quem não os tinha, preferiam fazer de conta que o assunto não era importante. Como agora o objectivo é meterem o bedelho onde não são chamados, já andam todos muito preocupados, a gastar tempo, dinheiro e tudo o mais que seja preciso.
Dois pesos e duas medidas. Depois venham falar de coerência.

4.2.10

"Mas por acaso alguém sabe quem foi o último rei de Portugal? Pois, bem me parecia..."

Não sabia da realização de protestos de alunos do ensino básico e secundário em várias cidades. Vi a reportagem há poucos minutos na televisão. E, claro, tenho alguma coisa a dizer sobre o assunto.
Eu fui aluna do sistema de ensino obrigatório português durante 12 anos, como exigido. E, por ter percorrido todo esse caminho, posso dizer com certeza que pouco aprendi. A maior parte dos conhecimentos que posso afirmar hoje ter ganhei fora das aulas, através de livros, jornais, revistas, programas de televisão, internet, muitas formas. A verdade é que o ensino obrigatório em Portugal é francamente miserável. Os programas são mal pensados, os objectivos raramente são atingidos, e mesmo quando o são, não se traduzem em verdadeiros conhecimentos, a grande maioria dos professores não tem capacidades ou, mais importante ainda, vocação, para dar aulas.
Contudo, nada disto justifica o baixo aproveitamento escolar que muitos alunos têm. A verdade é que muitos não têm melhores notas porque não querem.
Mas, tendo em conta a situação específica que motivou estas manifestações, fui analisar as exigências dos alunos. Para começar, falta de condições físicas nas escolas; com isto concordo plenamente, tive a infelicidade de frequentar escolas sem as mínimas condições. Revogação do estatuto do aluno; o estatuto do aluno só foi implementado depois de eu ter terminado o ensino secundário, mas grande parte das medidas que impôs parecem-me completamente estapafúrdias, como já era de esperar de medidas tomadas nesse período negra da história da educação portuguesa que foi o ministério de Maria de Lurdes Rodrigues. Ainda tive de apanhar com aulas de substituição, que servem para coisa nenhuma, mas felizmente já não apanhei com a história das faltas justificadas que chumbam na mesma. Se é para chumbar de qualquer forma, para quê ir às aulas? Implementação real das aulas de educação sexual; concordo completamente, deviam ter sido implementadas há muitos anos, nem sequer devia ser necessário fazer leis para implementar aulas que esclarecem dúvidas cruciais no desenvolvimento dos jovens (mas, claro, vivemos num país de mentes fechadas, não se pode falar de sexo, é pecado). Mas depois vem a exigência que me motivou primeiro este texto: fim dos exames nacionais. E isto eu não entendo. Confesso que não morro de amores pelos exames nacionais, para mais porque aqueles que fiz foram essencialmente ridículos, focando matérias que não tinham o mínimo interesse para o futuro escolar dos alunos. Mas acho que, apesar disso, são necessários. Concordo que a sua percentagem na nota final do aluno diminua, sim, foi por causa desses exames que a minha média de entrada no ensino superior caiu redondamente. Mas ainda assim, algum tipo de exame é necessário.
Agora um apontamento, não em relação às ideias, mas às pessoas. Assisti à reportagem feita na televisão, para a qual foram entrevistados vários alunos. Alguns falaram muito bem, mostraram acreditar naquilo que diziam, ter ideias reais e propostas para melhorar o sistema de ensino. Mas depois foram entrevistados alunos e alunas que me fizeram sentir vergonha. Repito, vergonha. Miúd@s histéric@s, que não faziam a mínima ideia porque ali estavam, que riam como se fossem criancinhas, e que participaram em protestos dos quais não percebiam nada apenas para ter uma desculpa para faltar às aulas. E infelizmente, isto é a grande maioria dos estudantes portugueses. Pessoas que não pensam pelas próprias cabeças. O futuro de Portugal, para me armar um bocadinho em nacionalista, depende de pessoas como estas, que riem quando deveriam falar de assuntos sérios, que têm cérebros vazios, conhecimentos inexistentes, e nenhuma responsabilidade. Uma pena.

3.2.10

"Pois é o seguinte, amigo, você pode bater na sua mulher como bem lhe apetecer, mas não a pode obrigar a usar a burqa, ok?"

Eu ando a mentalizar-me que devia de deixar de ler jornais. Juro que ando. Mas a curiosidade é mais forte. Depois as úlceras que se queixem.
Nos últimos tempos tenho visto uma série de textos, em blogues, jornais e quejandos, sobre a proibição do uso da burqa e do niqab em espaços públicos, na França. Faço já a minha declaração de intenções: eu sou contra o uso dos véus completos, mesmo que seja no contexto cultural do Islão, porque acho que é simplesmente estúpido cobrir uma mulher dos pés à cabeça para impedir os estranhos de olharem para ela (isso a mim dá-me é ainda mais curiosidade, mas pronto). Mas, mais ainda do que isso, eu defendo a liberdade de escolha, que é uma coisa que anda pelas ruas da amargura por estes dias. Aqui está um texto onde é defendida uma opinião parecida com a minha, mas muito mais bem fundamentada, claro.
Pelo que tenho visto nos últimos anos, tem havido um aumentado da xenofobia europeia em relação ao Islão, visível, por exemplo, no referendo suíço contra os minaretes (de que falei na altura). Este é só mais um passo para esse preconceito.
Mas agora dou de caras com esta notícia. E fiquei lixada. Eu já estava de mau humor, mas fiquei ainda pior. O meu problema não é impedirem que um tipo que tenciona tapar a mulher dos pés à cabeça com um pano de receber a nacionalidade francesa. Acho muito bem que o tenham feito. O meu problema é que não impedem tipos que batem nas mulheres, tipos que matam pessoas, tipos que roubam, violam, cometem todos os crimes possíveis, de receber a nacionalidade. Mas como andam com um ataque de preconceito contra o Islão, e contra os árabes em geral, por ignorância, proibiram este (é favor ver a diferença entre árabes e muçulmanos, para não serem tão ignorantes como esses preconceituosos). Onde é que fica a coerência? Para quê gabarem-se de que vivem numa democracia, num país civilizado, se depois não têm princípios?

Parece que o tempo na Madeira não anda bom. Deve ser Deus a castigar o Alberto João Jardim.

As aulas recomeçam segunda-feira. A turma está de rastos. O C. continua em casa, a recuperar da quimioterapia. A L. entrou em morte cerebral há três dias. Assim, sem mais. Devia haver avisos para estas coisas.
Um tipo decidiu tentar abalroar-me com o carro porque não gostou da forma como eu entrei numa rotunda. Adoro os condutores portugueses.
Já ninguém se lembra da gripe A, que parece que foi um flop nas bilheteiras, e já quase ninguém se lembra do terremoto no Haiti. Nem me lembro do que aconteceu antes. Agora falase do Orçamento de Estado, e do "caso Mário Crespo". Jornalismo de "o homem que mordeu o cão" é sempre bom.
O casamento entre pessoas do mesmo sexo continua em águas de bacalhau. Pode ser que lá para o natal se resolva.
O Vítor Constâncio, que ganha quase 20 mil euros todos os meses, diz que o IVA tem de aumentar. Ele que enfie o IVA e o salário no olho do cu, porque como já é de esperar não se lembra que quem vive com o salário mínimo nacional não concorda com essa ideia. Pensar nos pobres dá muito trabalho.
Afinal o défice não era de 5%, era de 9%. Economia para mim é chinês, mas soa-me a esquema para arranjar votos.
É por estas e por outras que eu não gosto de férias.

16.1.10

"O feminismo poderia libertar os homens, se as mulheres deixassem."

Eu sou uma feminista, da pior espécie. Segundo o dicionário que consultei, o feminismo é o "sistema dos que preconizam a ampliação legal dos direitos civis e políticos da mulher ou a igualdade dos direitos dela aos do homem". Eu tenho tendência para ver os homens como puro desperdício de tempo, dinheiro, e matéria humana, por razões que, segundo a psicóloga de serviço (eu sei, não és psicóloga, mas isso não interessa :P), se prendem com o facto de eu considerar a mulher como um ser perfeito, admirável em todos os sentidos, e por isso nenhum homem ser suficiente bom para merecer a sua presença sequer.
Na minha mente retorcida os homens servem para nos fazer perder tempo, quando nos perdemos nas estradas porque eles se recusam a pedir indicações, para deixar sempre a tampa da sanita levantada, e diversas outras actividades diárias profundamente inúteis. E a que vem isto tudo? Porque reli este texto da Inês Pedrosa, que já saiu há umas semanas, mas que me pareceu interessante. As feministas, na sua ânsia de igualdade, acabaram por, em parte, se isolar de muita coisa com a desculpa de serem "expressões primárias tomadas de empréstimo ao léxico masculino", para dar um exemplo. E sim, eu sei que a minha atitude é exactamente essa, essa ideia de completa exclusão, e que vou ter de trabalhar muito estes meus neurónios para fazer o caminho contrário. Talvez um dia. Para já, leiam o texto.

"Qual é exactamente o problema de uma criança ser adoptada por dois homens ou duas mulheres?" Nenhum.

Transcrevo na íntegra este texto, do blog Bomba Inteligente, de Carla Hilário de Almeida Quevedo, e que descobri graças a este post do Eduardo Pitta:

"Rádio Blogue: Adopção por casais homossexuais
A nova lei do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo não inclui a possibilidade de adopção. A primeira consequência desta exclusão recai sobre os homossexuais que já adoptaram uma criança e que podem querer casar. O que poderá, então, acontecer aos casais do mesmo sexo que queiram contrair casamento, no caso de um dos cônjuges ter uma criança a seu cargo? Em declarações ao Público, o deputado José Lello afirmou que o PS admite «(…) ter de clarificar o texto, o que pode implicar dar um retoque na redacção do ponto dois do artigo referente à adopção para que não fique a ideia de que se vão coarctar direitos adquiridos». Ainda como noticia o Público, «[n]o referido ponto dois, ficou estabelecido que “nenhuma disposição legal em matéria de adopção pode ser interpretada em sentido contrário ao disposto no número anterior”, no qual se consagra que a nova lei veta a adopção “por pessoas casadas com cônjuge do mesmo sexo”.» O descontraído «retoque» proposto pelo PS, a ser concretizado, criaria uma nova situação de desigualdade incompreensível: teríamos casais homossexuais com crianças e outros proibidos de adoptar. Pouco depois das declarações de José Lello, o vice-presidente da bancada parlamentar socialista, Ricardo Rodrigues, afirmou o seguinte ao Diário de Notícias, no caso de a lei vir a ser chumbada pelo Tribunal Constitucional: «Actuaremos em função dessa eventual nova realidade». Isto significa que o PS vai deixar cair a lei ou vai tentar incorporar a adopção? A promessa de José Sócrates para o casamento homossexual não incluiu a adopção porque envolvia «uma terceira pessoa». Reflictamos, então, sobre o tão badalado «superior interesse da criança». Se a educação de uma criança depende de situações ditas ideais, os primeiros responsáveis pelo colapso da família são os casais heterossexuais. Quem não tem pai nem mãe merece ser condenado a uma vida numa instituição social? Qual é exactamente o problema de uma criança ser adoptada por dois homens ou duas mulheres? Como sabemos que um casal gay é menos competente na educação de uma criança que um casal heterossexual?".

13.1.10

Se tivesse ficado calado, se calhar fazia melhor figura...

Eu sei que não é a altura certa. Sei que é um momento terrível, que milhares de pessoas possivelmente morreram, que muitas mais ficaram feridas, que têm as vidas completamente destruídas. Mas estas coisas irritam-me. E eu não me sei calar.
Irrita-me mesmo muito que tantos países estejam a fazer tudo o que podem, enviando comida, medicamentos, hospitais de campanha, cães pisteiros, água!!, água potável, que neste momento as pessoas do Haiti não têm, e a única coisa que o líder da organização não governamental mais rica e poderosa do mundo, a Igreja Católica, manda são orações. Orações!!
As orações não tiram pessoas de debaixo dos escombros, não lhes tratam as feridas, não lhes matam a sede nem a fome. A Igreja Católica tem dinheiro suficiente para acabar com a fome no planeta inteiro, e a única coisa que faz pelos milhares de pessoas que estão neste momento feridas e desalojadas é enviar orações. Pois merda para o Papa, que não sai de cima dos seus sapatinhos Prada que custam uma fortuna para dar água a quem morre de sede!

Não pretendo com este texto ofender as crenças religiosas seja de quem for. Respeito e admiro aqueles que acreditam na fé cristã e na fé católica, mas não respeito e, principalmente, ponho em causa a acção da Igreja Católica como instituição.


Já agora, se querem ser realmente úteis, façam por isso: donativos via multibanco, para a AMI com a entidade 20 909 e referência 909 909 909; para a Cruz Vermelha Portuguesa com a entidade 20 999 e a referência 999 999 999. Qualquer donativo importa!

11.1.10

"eu/ humilde e cansado piloto/ que só de te sonhar me morro de aflição"

Não me lembrava desta data. Foi a Ana Vidigal que ma recordou.
Al Berto é o meu poeta, aquele poeta cujas palavras, por algum motivo, me tocam, de quem decorei versos de tanto os ler. Faria 62 anos hoje, se fosse vivo. Não tive a honra de o conhecer, e só descobri os seus textos depois de ter falecido. Cedo demais. Mas pelo que sei viveu a vida como aquilo que ela é, a única que temos. E fez muito bem.

9.1.10

O primeiro dia do resto das nossas vidas* 4 (é o último, agora vou ali ser um bocadinho mais feliz e já volto)



Ouçam bem cada palavra. Se quiserem o texto está aqui.

A única coisa que tenho a dizer é muito obrigado, Miguel!

*roubado à Ana Vidigal, do Jugular , e ao Eduardo Pitta, do Da Literatura.

8.1.10

O primeiro dia do resto das nossas vidas* 3

O dia está a correr mesmo bem. Não só o projecto de lei sobre o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo foi aprovado, como soube que a minha candidatura a bolsa de estudo foi aceite. É mesmo um dia para recordar :)

*roubado à Ana Vidigal, do Jugular , e ao Eduardo Pitta, do Da Literatura.

O primeiro dia do resto das nossas vidas* 2

O casamento civil entre pessoas do mesmo sexo acabou de ser aprovado na Assembleia da República. Acaba aqui um longo caminho de luta pela igualdade no direito ao casamento civil. mas começa uma nova luta pela possibilidade de adopção. Tenho esperança que este seja um meio de diminuir a homofobia e a discriminação em Portugal.
O projecto de lei do Governo, que legaliza o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, foi aprovado na Assembleia da República com os votos a favor do PS, PCP, BE, PEV e de um deputado do PSD. A iniciativa popular de referendo foi rejeitada com os votos contra do PS, PCP, BE e PEV. Os projectos de lei do BE e PEV, que legalizam o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo e a adopção por casais formados por pessoas do mesmo sexo, foram rejeitados com os votos contra do PS, PSD, CDS-PP e a abstenção do PCP.

Vejam a cronologia feita pela Fernanda Câncio sobre os 36 anos de luta contra a discriminação dos homossexuais.


PS.: queres casar comigo?


*roubado à Ana Vidigal, do Jugular , e ao Eduardo Pitta, do Da Literatura.

O primeiro dia do resto das nossas vidas* 1

A decorrer o debate sobre os projectos de lei sobre o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo e sobre a petição para referendo do mesmo assunto, em directo no site da Assembleia da República.

*roubado à Ana Vidigal, do Jugular , e ao Eduardo Pitta, do Da Literatura.

7.1.10

LES Online

Surgiu no passado dia 28 de Dezembro a primeira revista online dedicada a estudos e investigações sobre a temática lésbica. É a LES Online e no site encontra-se uma espécie de declaração de intenções: "O LES Online tem como objectivo contribuir para a reflexão sobre questões lésbicas e promover os direitos e a igualdade de oportunidade das mulheres lésbicas.".
Tive conhecimento desta iniciativa na secção gay da revista Time Out que, pela mão de Bruno Horta, tem feito um trabalho excelente na divulgação de formas de arte, como exposições, livros e filmes, ou de espaços ligados à temática LGBT, assim como entrevistas a figuras conhecidas, sobre o mesmo tema.
Acho que esta iniciativa é muito boa, dando uma nova visibilidade a um tema um pouco esquecido: a temática homossexual tem sido objecto de muitos textos na comunicação social mas, por razões históricas e sociológicas, são os gays quem recebe mais atenção, enquanto as lésbicas tendem a ficar "na sombra". Não estou a fazer disto uma queixa, é a realidade das coisas. Pode ser que venham, com acções como esta, a tornar-se diferentes.

6.1.10

"Já viram, 90 mil, 90 mil é muito. É 1%, vejam lá. Mal enche um estádio. Pois, se calhar até nem é assim tanto..."

Pois é, meus caros, voltei a comprar o Público. Eu sei o que é que estão a pensar, e sim, parece existir um ser muito masoquista dentro de mim. Como já era de esperar, na página do espaço público dei de caras com um texto de um senhor chamado Lourenço Martins, de quem, confesso a minha ignorância, nunca tinha ouvido falar, "Juiz Conselheiro Jubilado", no qual o autor defende o referendo sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Por baixo aparece um texto de Mário Vieira de Carvalho, musicólogo e professor universitário, que é contra o mesmo referendo. E podiamos passar aqui uns parágrafos a falar da disposição dos textos na página: o texto de Lourenço Martins tem direito a uma fotografia e a uma citação a vermelho, o que, segundo os meus poucos conhecimentos de publicidade, ajuda a tornar o texto apelativo; o texto de Mário Vieira de Carvalho não tem nada disso, passa quase despercebido. Sou eu que estou conspirativa ou isto parece estranho?
Do texto de Mário Vieira de Carvalho não tenho nada a apontar. Assinala a hipocrisia de quem defende o referendo exclusivamente para impedir a legalização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, que são a maior parte das pessoas que o defendem.
Quanto ao texto de Lourenço Martins, como habitualmente, tenho muito a dizer. Começa por dizer que "o referendo está previsto na Constituição da República como uma expressão de pronúncia directa do povo sobre questões de relevante interesse nacional." É verdade. Como sou uma pessoa prevenida fui ver a Constituição e cito a alínea 3 do artigo 115.º: "O referendo só pode ter por objecto questões de relevante interesse nacional que devam ser decididas pela Assembleia da República ou pelo Governo através da aprovação de convenção internacional ou de acto legislativo." Mas nem esse artigo da Constituição, nem nenhum outro, explica o que são questões de relevante interesse nacional. Então quem diz ao senhor juiz conselheiro, e a todos os que andam por aí a agitar o referendo como bandeira de guerra, de que nesta situação é necessário um sufrágio popular?
Continuando, vejo que o senhor ainda não tinha conhecimento, quando escreveu o texto, do planeamento da votação em Assembleia da República da petição, assinada por 90 mil pessoas que defendem o referendo, no dia 8, em conjunto com os projectos de lei do Governo, do BE e do PEV sobre o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. Pois meu senhor, metade da sua crónica perde-se devido ao mau timing. Acontece.
Em seguida afirma que "este afogadilho em resolver o assunto é chocante e o próprio Presidente daRepública reagiu indirectamente ao mesmo." Pois, é chocante, é chocante o esforço feito por um grupo de pessoas para existir igualdade em Portugal, é chocante que haja quem queira que a sua dignidade seja respeitada. É chocante, sem dúvida. E não sei se o Presidente da República lhe disse, pessoalmente, que estava chocado por este assunto vir a ser resolvido. A mim não me disse isso. Mas também, o que ele diz pouco me importa, visto que o seu único argumento é o mais que repassado "há problemas mais importantes". Pode até haver, mas tanto há agora como haverá sempre, porque, caso ainda não tenham reparado, Portugal não vai passar da miséria; encontra-se lá há nove séculos, não me parece que seja na situação actual que vá sair.
Ora, a seguir surgem dois parágrafos onde o senhor fala, primeiro, sobre um parecer do Tribunal Constitucional sobre a suspensão do processo legislativo devido à entrega desta petição, e depois sobre a sua indignação de ver uma petição assinada por 90 mil pessoas não ser tida em conta pela Assembleia. Para ambos remeto a explicação de Isabel Moreira, professora de Direito Constitucional e pessoa em cujos conhecimentos confio. Segundo ela esta petição não tem o poder de suspender os trabalhos em curso e, principalmente, 90 mil pessoas não é assim tanto. Agradeço-lhe por se ter dado ao trabalho de fazer as contas, e de chegar à conclusão que 90 mil pessoas é menos de 1% da população nacional.
E temos mais um ponto com o qual não concordo: "E nem se diga que o facto de o partido no Governo a ter incluído [a questão da legalização do casamento] no seu programa significou a adesão dos portugueses." Ora, não se diga porquê? Porque os portugueses são uns ignorantes e preguiçosos que votam nos partidos sem saber o que eles defendem? Pois problema o deles! Tivessem-se informado antes, para não virem agora fazer figura de ursos.
Havia muito mais a dizer sobre isto. Havia centenas ou talvez milhares de páginas que se podia escrever, sobre a homofobia disfarçada, sobre o preconceito, sobre as mentalidades mesquinhas que defendem apenas a moral e os bons costumes, que se preocupam apenas com as aparências e nunca com a igualdade, a dignidade ou a felicidade dos outros. Eu fiz o que podia fazer, votei em quem defendia os meus direitos. Agora só me resta esperar que haja mais deputados que vejam o que realmente vale a pena defender: a igualdade e a felicidade, ou as aparências e as tradições bacocas.

5.1.10

"Vamos lá entregar a petição, que a seguir temos de ir fazer outra contra essa coisa horrível que é as pessoas serem felizes. Que nojo!"

Hoje, 90 mil assinaturas foram entregues na Assembleia da República. 90 mil assinaturas de 90 mil pessoas que acham que eu, e cerca de um milhão de pessoas deste país, não temos o direito de ser felizes. Porque, segundo essas 90 mil pessoas, estamos a atentar contra a instituição do casamento.
Ora bem, eu não tenho interesse nenhum em meter-me nas vidas dessas pessoas. Não tenho interesse nenhum em saber como funcionam, ou se funcionam, os casamentos dessas pessoas. E se essas pessoas estão assim tão interessadas na vida de quem pretende casar com alguém do mesmo sexo, é porque os seus casamentos são um redondo falhanço, e vivem numa infelicidade tal que só lhes resta insistir na infelicidade dos outros para não se sentirem tão mal.
Eu não tenciono casar com essas 90 mil pessoas. Logo, a minha vida não lhes diz respeito. Não têm nada a ver com quem eu caso ou deixo de casar. Eu quero ter o direito de casar com quem amo, seja um homem ou uma mulher. Eu exijo esse direito, que me deveria ser garantido pelo simples facto de ter nascido como um ser humano.
Infelizmente há muito mais de 90 mil pessoas que acham que há seres humanos com mais direitos que outros. Tenho muita pena em viver num país com pessoas assim.

4.1.10

Um novo paradigma social, por São José Almeida

"O reconhecimento do direito ao casamento civil de homossexuais, que será debatido pelo parlamento para a semana, é um salto civilizacional pelo que significa de concretização de um novo paradigma de organização social.
Maior do que à primeira vista possa parecer e não reduzível às tentativas de ridicularização, esta consagração, caso venha a ser uma realidade dentro de meses, vem colocar no plano do reconhecimento pelo Estado os direitos de personalidade - sublinhe-se que a sexualidade é estruturante desta. E este aspecto dos direitos humanos é a consagração absoluta do que pressupõem os valores democráticos que dizem que todas que dizem que todas as pessoas nascem livres e iguais.
Desde da aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, que a instituição destes princípios tem feito um longo caminho. Um dos degraus que nos últimos anos têm sido subidos são precisamente o dos direitos individuais, como os direitos das mulheres e os direitos dos homossexuais.
Mas ao consagrar que a união entre duas pessoas contemplada pelo casamento civil, que tem como pressuposto básico o relacionamento afectivo e sexual, possa ser praticada por homossexuais o Estado português está fazer uma mudança radical no domínio do simbólico: o reconhecimento pela lei de direitos plenamente idênticos entre todas as pessoas sem esconder a sua sexualidade, incluindo aquelas cuja sexualidade não obedece à norma padrão do modelo de relação familiar que domina, sexualidade essa que ainda é vista por muitos como doença, como perversão, pois é não procriativa.
É precisamente a capacidade de o Estado reconhecer igualdade de tratamento com base na sexualidade que é um sinal de mudança de paradigma no entendimento das relações sociais. Não mais a sociedade portuguesa está dividida e classificada de acordo com a concepção de sociedade que tem dominado na cultura judaico-cristã e que assenta no modelo patriarcal heterossexual procriativo como o único aceite como válido.
É certo que este modelo não é o único seguido pela sociedade, nem nunca foi. É certo que, com a procriação medicamente assistida, para haver família, já nem é preciso acto sexual. É certo também que já havia reconhecimento de direitos aos homossexuais, que a igualdade de tratamento e o direito à não discriminação com base na sexualidade está consagrado no artigo 13º da Constituição.
Mas a verdade é que este direito ao casamento estabelece o limiar mítico e mágico, o limiar simbólico de reconhecimento de um estatuto que é estruturante da sociedade. Daí o horror dos sectores conservadores - apostados em que não haja mudança de paradigma de organização social - em que este reconhecimento de direitos use o nome de casamento.
É uma realidade que o problema da discriminação com base na sexualidade não acaba, pois há discriminações dos homossexuais que permanecem, como o do direito à adopção, que só por medo não fica agora resolvido, abrindo-se a porta a que o Tribunal Constitucional se pronuncie contra a lei, por criar uma nova discriminação, já que ela é permitida aos heterossexuais casados e a todos os solteiros. Bem como continua a discriminação dos transexuais e dos transgéneros. Mas o carácter revolucionário desta mudança na lei vai muito para além do que é o reconhecimento de direitos iguais às várias sexualidades.
A admissibilidade pelo Estado de que o casamento é permitido a pessoas do mesmo sexo vem colocar, finalmente, em igualdade perante a lei a mulher e o homem. Isto, porque a sociedade portuguesa deixa de ser concebida com base na divisão entre homem e mulher, que são diferentes e se complementam, na união patriarcal heterossexual e procriativa. E se se completam - mais, se existem para se completar -, então são seres ontologicamente diferentes.
É essa concepção desigualitária das relações sociais básicas que é quebrada pelo Estado português ao admitir - tal como o fizeram vários Estados e estão a fazer muitos outros - este novo paradigma de relacionamento social e ao subir um patamar de importância imensa na persecução dos direitos humanos. Agora mulheres e homens, homossexuais e heterossexuais estão simbolicamente em pé de igualdade no novo modelo de organização social.
E aqui reside a razão da reacção brutal e profunda que tem surgido na sociedade portuguesa a esta alteração - que em termos civilizacionais se equipara ao fim da escravatura ou ao reconhecimento do direito a exercer o voto eleitoral às mulheres. É que os sectores mais conservadores da sociedade portuguesa, onde predomina o fundo cultural judaico-cristão, estão precisamente a reagir na tentativa de defenderem o seu modelo de organização social que apenas assentava no reconhecimento da relação afectiva e sexual que se estabelece na constituição de família através do casamento civil ao par patriarcal heterossexual e pocriativo, para quem os direitos dos homossexuais são uma fantasia perigosa de alguns radicais de esquerda ou de direita, assim como o são os direitos das mulheres - basta ver como a Igreja católica portuguesa se tem pronunciado sobre a igualdade entre mulheres e homens. Setores conservadores esses que ainda não perceberam ou querem fazer de conta que não perceberam que o mundo mudou e está a mudar. E que o paradigma apontado pela Declaração Universal dos Direitos Humanos está a ser conquistado passo a passo e a enquadrar as relações sociais - e não apenas os aspectos simpáticos e pseudo-caritativos para os pobrezinhos que estão nesse documento.
Resta saber até que ponto o PS tem de facto a dimensão da mudança de paradigma social que está em jogo e se não deita tudo a perder no tacticismo do jogo político perante a pressão de um referendo. Até porque, mesmo que Cavaco silva decida defender publicamente o referendo, ele não pode convocá-lo sem a maioria da Assembleia. O máximo que pode fazer é repetir a actuação que teve na aprovação dos rstatuto dos Açores. A ver vamos se o PS mantém na defesa dos direitos individuais dos homossexuais a convicção que mostrou em defesa dos direitos políticos dos açorianos."
Fonte: Público 30 de Dezembro de 2009
Encontrado aqui.