31.12.09

Balanço de 2009 (já que toda a gente faz eu também tenho direito a fazer um)

E 2009 acaba. Foi um ano complicado, mas parece-me que passou muito depressa. Não foi bem o que eu tinha planeado, mas até nem correu mal.
Tinha decidido que me iria esforçar e dedicar nas aulas e ter boas notas. Não me esforcei tanto quanto podia, as notas não foram tão boas quanto podiam ter sido.
Magoei-me, sofri, fui traída, perdi pessoas em quem achava que poderia confiar sempre. Mas fiz novos amigos e, acima de tudo, encontrei alguém que me faz verdadeiramente feliz.
2009 foi possivelmente o ano em que mais mudei. Não querendo soar convencida, foi o ano em que mais cresci. Comecei o ano como uma pessoa infeliz e resignada, que achava que as coisas nunca iriam mudar, que a sociedade iria ser sempre a mesma porcaria, e que eu não podia fazer nada em relação a isso. E acabo o ano a achar que a sociedade continua a ser uma porcaria, mas a saber que é assim porque existem pessoas como aquilo que eu era, que se resignam, que não fazem o mínimo esforço para mudar nada. Pode ser um esforço que não vale nada, mas faço-o. E o meu esforço é apenas um, podem existir muitos outros, e as coisas podem mudar (obrigado por me teres feito acreditar num futuro melhor, meu amor :) ).
Por exemplo, no início do ano eu não esperava que houvesse uma data possível para a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo. E agora há uma data para a discussão do assunto, e já não parece uma miragem, já parece possível.
Este ano valeu a pena. Teve bons e maus momentos, como sempre. Mas agora consigo pensar mais nos bons momentos. Ah sim, estava-me a esquecer, e consegui deixar de fumar :D (mais de dois meses sem tocar num cigarro).
Não sei como vai ser o próximo ano. Não vou fazer uma lista de coisas para cumprir. Tenho planos, claro: acabar a licenciatura, começar o mestrado, arranjar um trabalho em part-time, continuar a ser feliz :) Mas não importa. Vou-me esforçar para que seja bom, e é isso que interessa.

29.12.09

"Ó Maria, anda ver isto, que pouca vergonha, ai temos de experimentar."

Já aqui disse o quanto gosto da Inês Pedrosa. Mas tenho de voltar a dizer, porque mais uma vez uma crónica dela me pareceu simplesmente brilhante (apesar de já ter uns dias de atraso, acontece, contingências da vida).
Eles não se importavam com ninguém
"Até chamei a minha mulher para ver e da janela da minha casa assistia-se a tudo". O tudo a que se assistia era um casal de jovens dentro de um carro namorando com muita intensidade. "Eles não se largavam. A rapariga estava sem camisola e o rapaz estava com as calças para baixo. Eu e outras pessoas passámos junto ao carro, mas eles não se importavam com ninguém", explica o mesmo mirador, definido pelo "Diário de Notícias" do passado dia 10 de Dezembro como morador. Não foi por falta de esforço deste voyeur convicto que os namorados se mantiveram embrenhados um no outro, fora do mundo: o homem viu da janela, chamou a sua Maria para que partilhasse a entusiasmante visão - na esperança de que ela aprendesse alguma coisa? - , depois desceu à rua, rondou o carro, e nada. "Quem foi passando na rua ficou 'escandalizado' com o que viu, sobretudo por ser ainda de manhã, e chamaram a Polícia Municipal. A patrulha chegou ao local ainda a tempo de apanhar os jovens em flagrante delito", conclui o "DN". A notícia tem por título 'Casal apanhado a fazer sexo oral', e surge devidamente ilustrada com a fotografia de uma rua desabrida e a legenda "Foi neste local de Paredes que os jovens se entregaram ao sexo". Lembrei-me de um poema de Daniel Filipe que lia, relia e sublinhava nos meus tempos de liceu, sobre um homem e uma mulher que "inventaram o amor com carácter de urgência" e foram perseguidos por isso mesmo. Estes jovens vão responder em tribunal pelo crime de atentado ao pudor. Sobretudo por "ser ainda de manhã"? Se tivessem guardado os seus ardores para o cair da noite, seria o 'atentado' menos grave?

A expressão "moradores escandalizados" é várias vezes repetida ao longo da notícia. A mim, escandaliza-me a existência da notícia. Ou melhor: escandaliza-me que o centro da notícia seja o 'escândalo' declarado pelos moradores e não o 'escândalo' da condenação judicial dos jovens. Quantas pessoas fazem sexo dentro de automóveis - por não poderem fazê-lo em casa dos pais, por não terem dinheiro ou coragem para alugar um quarto de hotel ou porque, simplesmente, começam a beijar-se e não conseguem parar de se entregar um ao outro? Que mal vem daí ao mundo? O desejo, os beijos, os abraços, fazem mal a quem? Os 'moradores escandalizados' reagiriam do mesmo modo se vissem, dentro ou fora de um carro, um adulto espancar uma criança, um homem espancar uma mulher (ou vice-versa, mas é menos frequente) ou um grupo de jovens humilhar outro? Estas coisas acontecem diariamente e não vêm nos jornais, nem são alvo de processo judicial. Imagino a reacção dos pais da rapariga, lá em Paredes, a este processo. Imagino os castigos a que será submetida, já fora da alçada do flagrante delito.

Enquanto escrevo estas linhas passa num canal de televisão uma das muitas obras-primas de Clint Eastwood, "A Troca", filme inspirado na história verdadeira de uma mulher a quem desapareceu o filho e que a polícia interna num manicómio depois de lhe ter devolvido um rapazinho que não era o seu e arquivado o processo. Durante séculos as mulheres que se rebelavam contra as autoridades foram fechadas em hospícios, sujeitas a choques eléctricos - para as libertar da 'histeria' própria do seu sexo - e anuladas como seres humanos. Ainda acontece, em mais lugares do que supomos. A penalização doméstica e social da rapariga apanhada neste 'flagrante delito' será equivalente à do rapaz?
Entretanto, como é que eu faço para conseguir que a Polícia Municipal resolva os atentados ao pudor que me preocupam e escandalizam?

Escandaliza-me o desespero das pequenas empresas que chegam ao fim do ano sem conseguir pagar os salários aos seus funcionários porque os senhores que mandam ainda não tiveram tempo, dois meses depois das eleições, de delegar competências e fazer com que as contas dos serviços prestados sejam pagas. Escandaliza-me que os compromissos assumidos por um candidato político sejam esquecidos ou negados assim que toma o poder. Escandaliza-me o dinheiro público atirado à rua em festanças inconsequentes, em vez de investido nos instrumentos e símbolos maiores de educação e promoção do país. Estes flagrantes delitos que ocorrem à vista desarmada e à luz fria do sol de Dezembro, não escandalizam ninguém? Não interessam os jornais?

Eu também sou jovem, eu sei o que é desejar desesperadamente uma pessoa, e sim, eu já fiz coisas que meio mundo considera impróprias em lugares pouco adequados. E então? Sou pior pessoa por isso? Porque raio é que esta gentinha só se preocupa em ver os outros a fazer sexo, em vez de se meterem nas suas vidas? Isto a mim parece-me uma grandessíssima dor de cotovelo, e não é para menos, segundo os estudos de que ouço falar a vida sexual da maioria dos portugueses vai de mal a pior...

27.12.09

... haverá luz ao fundo do túnel algum dia? ...

E mais um dia sem luz, para juntar à lista. Vai-se vivendo da caridade dos outros, olha carrega-me a bateria do telemóvel se faz favor, coiss assim.
O que diz a EDP? Não temos previsões de quando será possível arranjar a avaria. Pois claro que não têm. Nunca têm previsões de coisa nenhuma, nunca sabem nada, nunca arranjam nada. Uma empresa com cobertura nacional, sem concorrência (não se pode comprar electricidade a mais nenhuma empresa), não tem técnicos para arranjar os estragos em digamos 15 concelhos. Imaginem se os estragos tivessem sido nos trezentos e muitos concelhos do país, ia ser lindo.
As meninas com voz melosa dizem-nos que temos de ser pacientes. Claro que temos. Temos de ser pacientes mesmo depois de a paciência se esgotar, e começarmos a imaginar coisas extremamente móbidas e violentas. Temos de ser pacientes até chegarem os técnicos da EDP, que vão ser linxados pela população enfurecida, depois de arranjarem a avaria (nós estamos irritados, não somos estúpidos ;) ). Estou a brincar. Acho eu.

26.12.09

É tão romântico viver como na Idade Média...

Eu sou uma pessoa razoavelmente paciente. Não muito, mas um bocado. O suficiente para nunca ter morto ninguém, por muito que as pessoas me irritem. Mas agora estou a pontos de matar alguém. Muita gente até.
E o que se passa é o seguinte: há,pelo menos, quatro dias que não tenho electricidade. Imaginem as vossas vidinhas, durante mais de quatro dias, sem electricidade. Sem luz, sem aquecedores (e está um frio do caraças), sem televisão, sem computador sem nada. Quatro dias a viver à luz de velas. É mau, é péssimo.
Isto mostra-me uma coisa: a incompetência da EDP. Houve muitos estragos, eu sei que sim. Mas eles não têm pessoas suficientes para reparar os estragos em 4 dias? Se não têm, caramba, porque raio é que eu lhes pago um balúrdio?
Já ultrapassei todos os limites da sanidade mental. Ando a imaginar atacar técnicos da EDP e espetá-los em postes de electricidade, coisas um bocado mórbidas. Mas pronto. Pode ser que isto se resolva algum dia.

23.12.09

Afinal o natal veio mesmo mais cedo, veio de antevéspera.

Estava lixada. Estava para lá de lixada. Passar a manhã a tratar de burocracia com a indescritível companhia do meu pai. Não podia estar mais lixada.
Mas depois a senhora da EDP começou a pôr notas de 50 em cima do balcão, e a dizer que era a devolução do que tinhamos pago a mais. E depois soube que até tinha tempo de ir dar nem que fosse só um beijo ao meu amor antes do natal. E o meu lixamento diminuiu um bocado.
Pode ser que a conta bancária não esteja em crise outra vez em Janeiro.

22.12.09

Pode ser que o mundo evolua. Assim devagarinho. Quase parado.

Duas notícas que vi esta manhã e compensaram um bocadinho o medo/nojo/pena que me provocam muitas outras notícias que vejo todos os dias:

Casamento homossexual: Discussão no Parlamento agendada para 08 de Janeiro

19.12.09

Às vezes o natal chega mais cedo, e olhem que eu nem gosto muito do natal

Hoje ao almoço comentava com a minha mãe uma notícia que saiu há uns tempos nos jornais, e que narrava algo como "a Igreja quer ver questão do casamento gay resolvida antes da visita do Papa" (resolvida para a Igreja quer dizer adiada por tempo indefinido, de preferência até que toda a gente esqueça o assunto e volte tudo a ser como o senhor jesus cristo manda; e nem vale a pena comentar o erro inacreditável que é a recorrente expressão casamento gay, por muito que levem nas orelhas muitos jornalistas preferem ser ignorantes eternamente). E a minha mãe perguntava-me o que raio tem a Igreja ou o Papa a ver com o assunto.
Não falamos de nós, porque ainda não é tempo disso. Ela sabe que eu sou homossexual e eu sei que ela sabe e, de alguma forma, cá nos vamos entendendo assim. Mas foi, sem dúvida, um dos meus melhores momentos dos últimos tempos ver a enorme indignação na cara da minha mãe ao dizer que todos os seres humanos têm o direito de fazer escolhas e casar com quem bem entenderem. São as pequenas coisas que nem tiram alguns pesos de cima.

Centenas morrem devido a crimes de ódio. Mas o que é que isso interessa? Temos é de nos preocupar com a crise.

Para quem diz que a homofobia não mata, ou pior, que não existe discriminação pela orientação sexual. Acordem para a vida.

18.12.09

Regulamento das bichas malucas de Portugal

Regulamento das Bichas Malucas de Portugal

Capítulo Primeiro
Natureza e sede

Artigo Primeiro
(Natureza)

1- Todas as bichas malucas são contra-natura, estatuto que lhes é conferido pela própria categoria de bichas.
2- Todas as bichas malucas possuem perturbações de ordem mental e psíquica, ou não fossem elas “malucas”.

Artigo Segundo
(Sede)

1- As bichas malucas deste país têm sede em casulos, vulgo armários do Ikea, que são bonitos e funcionais e fazem pandã com os cortinados.
2- Qualquer bicha maluca pode assumir cargos na função pública ou em entidades privadas, com excepção de posições de topo no CDS.

Capítulo Segundo
Características

Artigo Terceiro
(Características)

1- Uma bicha maluca terá como modelo máximo o Jack McFarland.
2- As bichas malucas são irrevogavelmente responsáveis pelos seguintes fenómenos:
aquecimento global
violência doméstica
alcoolismo
tabagismo
laicização do Estado
incompetência de governos socialistas
queda do muro de Berlim
exploração da Via Láctea
eventual declínio da Humanidade e consequente implosão do sistema solar.

Capítulo Terceiro
Casamento, direitos e funcionamento

Artigo Quarto
(Casamento)

1- Uma bicha maluca poderá contrair matrimónio com outra bicha maluca, desde que possua autorização prévia do Papa, como mandam os costumes de um bom Estado laico.
2- Qualquer casamento entre bichas malucas deverá incluir pelo menos um manto cor-de-rosa.
3- Em alternativa ao arroz tradicionalmente atirado às fronhas do casal recém-casado, o casamento entre bichas malucas deverá incluir uma actividade de arremesso de brilhantinas.

Artigo Quinto
(Direitos)

1- São direitos inalienáveis das bichas malucas os constantes dos seguintes pontos:
relações heterossexuais;
participação em programas de decoração de interiores;
outras actividades de carisma estrictamente heterossexual.
2- Todos os direitos serão regulados, em última instância, pelo PNR, podendo este pedir pareceres a um membro do CDS-PP que não tenha adquirido submarinos nos últimos dez anos.

Artigo Sexto
(Funcionamento)

1- Cada bicha maluca possuirá um penduricalho, doravante denominado “pénis”.
2- As relações entre duas ou mais bichas malucas implicarão a presença de um mínimo de dois “pénis” ou uma embalagem de seis salsichas.
3- Em qualquer circunstância, as relações profanas entre duas ou mais bichas malucas deverá ser antecedida por um Pai Nosso e um Avé Maria, respeitando com isso os princípios de igualdade de género.

Capítulo Quarto
Disposições finais

Artigo Sétimo
(Casos omissos)

Os casos omissos pelo presente Regulamento serão regulados, quando previstos, pela legislação em vigor, sem prejuízo de qualquer disposição anti-constitucional* que prevalecerá em todas as situações.

*Por disposição anti-constitucional entende-se qualquer parecer mentecapto que sugira uma “anti-constitucionalidade” do disposto neste regulamento, e que terá certamente toda uma base legalista e jurídica de acordo com J. B. G.

Isabel Sanches

CC – Some rights reserved. This work is licensed under a Creative Commons Attribution-Noncommercial-No Derivative Works 3.0 License.

Os meus mais sinceros parabéns à autora. Visto primeiro aqui, mas o original é daqui.

17.12.09

Se calhar não vai ser preciso um piaçaba, se calhar pode até ser um casamento

Não é muito. É pouco até, se tivermos em conta que isto nem deveria de ter de ser debatido ou aprovado. Mas é um princípio :)

13.12.09

"Há outras coisas na vida, muito mais importantes. A começar pelo amor."

Sempre gostei dos textos da Inês Pedrosa, sejam crónicas ou ficção. É uma mulher inteligente, lúcida, fervorosamente dedicada à cultura, e cujos textos de prosa ficcional me parecem quase poéticos. E agora fiquei a gostar mais um bocadinho dela.
Soube-me tão bem ler este texto, publicado a semana passada na revista Única, do Expresso, pareceu-me tão correcto em todos os seus pontos, uma opinião tão coincidente com a minha, que decidi transcrevê-lo na íntegra. Façam o favor de ler.

A converseta moralucha em torno do casamento dos homossexuais recorda-me aquele fulgurante poema de Sophia de Mello Breyner que começa assim: "As pessoas sensíveis não são capazes/ de matar galinhas/ porém são capazes/ de comer galinhas". Não se pode chamar debate ou discussão ao que é apenas um tricô de preconceitos, uma espiolhagem salivante sobre a vida íntima dos outros. Os homossexuais têm o mesmíssimo direito ao casamento que todas as outras pessoas, porque o contrato de casamento não se estabelece a partir do tipo de práticas sexuais dos que o contraem. A 'ideia' de que o casamento tem por objectivo a procriação, como afirma a dra. Manuela Ferreira Leite, não é confirmada pela lei de nenhum país democrático, talvez porque nem sequer se lhe pode chamar 'ideia': não passa de um fogacho de autoritarismo deslocado. O casamento não é fácil - e toda a gente sabe que não é a procriação o que o sustenta. Demasiadas vezes, pelo contrário, a mimosa prole estoira com essa relação de carne e alma entre dois adultos. Há gente para tudo, mas, em geral, o sexo não suporta a transfiguração dos amantes em papá e mamã.

O casamento é uma decisão extraordinariamente séria. Os heterossexuais tendem a esquecê-lo, porque podem casar e descasar sempre que lhes apetecer. Desde que procriem, segundo os fanáticos da procriação, não há problema. Mas basta olharmos à nossa volta para verificarmos que é exactamente esse o problema: o frenesim da procriação atenta contra os direitos dos procriados, aqueles a que na adolescência passamos a tratar por malcriados. As novas gerações crescem num hipermercado de mães e pais que mudam de mês a mês como as promoções especiais. O mais elementar bom senso confirmará que uma criança adoptada por um casal homossexual estável terá muito mais hipóteses de desenvolver as suas capacidades do que uma outra - e são tantas, basta abrir as revistas ditas cor-de-rosa para o confirmar - que viva de 'tio' em 'tio', de madrasta em madrasta, até à perda de referências final.

O bom senso só não nos pode meter isto pelos olhos dentro porque, em Portugal, o cenário de um casal homossexual com filhos é inexistente. Por causa da moral de esquina, hipócrita, opressora, da maioria amorfa. O lado esquerdo dessa maioria diz coisas como: "Eu não tenho nada contra a adopção por homossexuais, mas o problema é que a criança vai ser discriminada na escola". Estes são os mesmos que há trinta anos diziam: "Eu não sou racista, mas não gostava que o meu filho casasse com uma negra porque as crianças seriam discriminadas na escola". Agora abanam a cabeça, enervados, e dizem: "Não, não é a mesma coisa: porque a criança necessita de um modelo masculino e de um modelo feminno". Que modelos são esses, nesta fase de mutação acelerada em que as mulheres ganham autoridade e os homens doçura? Que modelos eram esses - o pai que bebia e batia, a mãe que apanhava e chorava? O pai que mandava, a mãe que obedecia? O centro dessa maioria diz: "Não sou contra os casais homossexuais, arranjem-lhes leis que os protejam, mas não lhe chamem casamento". Estes estão imbuídos de uma noção de superioridade: chamem-lhe outra coisa, para não atingirem essa coisa sublime a que só nós, os que fazemos o sexo do qual podem nascer bebés, temos direito. A direita dessa maioria diz simplesmente: "Vivam lá a vida deles, mas discretamente". Ou seja, às escondidas, como os senhores faziam filhos às criadas.

O mundo já caminhou o suficiente (no Ocidente, claro), para entender que as crianças precisam de adultos que as amem. Um homem e uma mulher. Ou só um homem. Ou só uma mulher - os filhos dos viúvos, como se criam sem o tal modelo outro? Ou dois homens. Ou duas mulheres. As crianças precisam de modelos de amor. O amor, qualquer amor, ilumina. Os que se amam devem ter o direito à partilha e à herança um do outro. Devem ter o direito a acompanhar-se na saúde e na doença, em casa e no hospital, até ao último suspiro. As pessoas que pretendem negar a outras pessoas o direito ao casamento, fundamentando essa recusa no tipo de práticas sexuais dos outros, estão certamente a precisar de tratamento psiquiátrico. Porque só pensam em sexo e em poder, e há outras coisas na vida, muito mais importantes. A começar pelo amor.


7.12.09

Cimeira de Copenhaga

Transcrevo na íntegra o editorial de hoje, publicado em parceria com 56 jornais de 44 países, no dia da abertura da Cimeira de Copenhaga.

Se não nos juntarmos para tomar uma acção decisiva, as alterações climáticas irão devastar o nosso planeta, e juntamente com ele a nossa prosperidade e a nossa segurança. Desde há uma geração que os perigos têm vindo a tornar-se evidentes. Agora, os factos já começaram a falar por si próprios: 11 dos últimos 14 anos foram os mais quentes desde que existem registos, a camada de gelo árctico está a derreter-se, e os elevados preços do petróleo e dos alimentos no ano passado permitiram-nos ter uma antevisão de futuras catástrofes.

Nas publicações científicas, a questão já não é se a culpa é dos seres humanos, mas sim quão pouco tempo ainda nos sobra para conseguirmos limitar os danos.

Mas, mesmo assim, até agora a resposta a nível mundial tem sido frouxa e sem grande convicção.

As alterações climáticas estão a ocorrer desde há séculos, têm consequências que durarão para sempre, e as nossas perspectivas de as limitarmos serão determinadas nas próximas duas semanas. Exortamos os representantes dos 192 países reunidos em Copenhaga a não hesitarem, a não caírem em disputas, a não se acusarem mutuamente, mas sim a resgatarem uma oportunidade do maior fracasso político das últimas décadas. Não deverá ser uma luta entre os países ricos e os países pobres, ou entre o Oriente e o Ocidente. O clima afecta-nos a todos, e deve ser solucionado por todos.

A ciência é complexa mas os factos são claros. O mundo precisa de dar passos em direcção a limitar o aumento de temperatura a apenas dois graus centígrados, um objectivo que exigirá que as emissões de gases a nível global alcancem o seu máximo e comecem a diminuir durante os próximos cinco a dez anos. Um aumento superior, na casa dos três ou quatro graus centígrados – a subida mais pequena que podemos realisticamente esperar se ficarmos pela inacção –, secaria os continentes, transformando terra arável em desertos. Metade de todas as espécies animais extinguir-se-ia, muitos milhões de pessoas ficariam desalojadas, nações inteiras afundar-se-iam no mar. A polémica sobre os e-mails de investigadores britânicos, sugerindo que eles terão tentado suprimir dados incómodos, tem agitado o ambiente mas não causou mossa na pilha de provas em que estas previsões se baseiam.

Poucos acreditam que Copenhaga ainda consiga produzir um acordo completamente definido – progressos efectivos em direcção a um tal acordo apenas se poderiam iniciar com a chegada do Presidente Barack Obama à Casa Branca e a inversão de anos de obstrução por parte dos Estados Unidos. Mesmo hoje, o mundo vê-se à mercê da política interna norte-americana, pois o Presidente não se pode comprometer com as acções necessárias até o Congresso fazer o mesmo.

Mas os políticos presentes em Copenhaga podem, e devem, chegar a um acordo sobre os elementos essenciais de uma solução justa e eficaz e, ainda mais importante, um calendário claro para a transformar num tratado. O encontro das Nações Unidas sobre alterações climáticas do próximo mês de Junho em Bona (Alemanha) deverá ser a data-limite. Segundo um dos negociadores: “Podemos ir a prolongamento, mas não nos podemos dar ao luxo de uma repetição do jogo.”

No centro do acordo deverá constar um arranjo entre os países ricos e os países em desenvolvimento, determinando como serão divididos os encargos da luta contra as alterações climáticas – e como iremos partilhar um recurso novo e precioso: os milhões de milhões de toneladas de gases de carbono que podemos emitir antes que o mercúrio dos termómetros alcance níveis perigosos.

As nações ricas gostam de fazer notar a verdade aritmética de que não poderá haver solução até que gigantes em desenvolvimento como a China tomem medidas mais radicais do que têm feito até agora. Mas os países ricos são responsáveis pela maioria dos gases de carbono acumulados na atmosfera – três quartos de todo o dióxido de carbono emitido desde 1850. São eles que agora devem dar o exemplo, e cada país desenvolvido deve comprometer-se com cortes maiores, que dentro de uma década reduzirão as suas emissões para substancialmente menos que o seu nível de 1990.

Os países em desenvolvimento podem argumentar que não foram eles que criaram a maior parte do problema, e também que as regiões mais pobres do globo serão as mais duramente atingidas. Mas vão cada vez mais contribuir para o aquecimento, e por isso devem comprometer-se com as suas próprias medidas significativas e quantificáveis. Apesar de ambos não terem chegado tão longe quanto alguns esperavam, os recentes compromissos de objectivos de emissões de gases dos maiores poluidores do mundo – os Estados Unidos e a China – constituíram passos importantes na direcção certa.

A justiça social exige que os países industrializados ponham a mão mais fundo nos seus bolsos e garantam verbas para ajudar os países mais pobres a adaptarem-se às mudanças climáticas, e tecnologias limpas que lhes permitam crescer a nível económico sem com isso aumentarem as suas emissões. A arquitectura de um futuro tratado deve também ser definida – com um rigoroso acompanhamento multilateral, compensações justas pela protecção de florestas, e uma aceitável taxa de “emissões exportadas”, de modo que o peso possa ser partilhado mais equitativamente entre os que produzem produtos poluentes e os que os consomem. E a equidade requer também que a carga colocada sobre determinados países desenvolvidos tenha em conta a sua capacidade para a suportar: por exemplo, novos membros da União Europeia, muitas vezes mais pobres do que a “Velha Europa”, não devem sofrer mais do que os seus parceiros mais ricos.

A transformação será dispendiosa, mas muito menos do que a conta que se pagou para salvar o sistema financeiro internacional – e ainda muito mais barata do que as consequências de não fazer nada.

Muitos de nós, particularmente nos países desenvolvidos, teremos que alterar os nossos estilos de vida. A época dos voos de avião que custam menos do que a viagem de táxi para o aeroporto está a chegar ao fim. Teremos que comprar, comer e viajar de forma mais inteligente. Teremos que pagar mais pela nossa energia, e usar menos dessa mesma energia.

Mas a mudança para uma sociedade com reduzidas emissões de gases de carbono alberga a perspectiva de mais oportunidades do que sacrifícios. Alguns países já reconheceram que aceitar as transformações pode trazer crescimento, empregos e melhor qualidade de vida. Os fluxos de capitais contam a sua própria história: em 2008, pela primeira vez foi investido mais dinheiro em formas de energia renováveis do que para produzir electricidade de combustíveis fósseis.

Abandonar o nosso “vício de carbono” dentro de poucas décadas irá exigir um feito de engenharia e inovação que iguale qualquer outro da nossa História. Mas se a viagem de um homem à Lua ou a cisão do átomo nasceram do conflito e da competição, a “corrida do carbono” que se aproxima deverá ser norteada por um esforço de colaboração, de forma a alcançarmos a salvação colectiva.

Superar as mudanças climáticas exigirá o triunfo do optimismo sobre o pessimismo, da visão a longo prazo sobre as vistas curtas, daquilo a que Abraham Lincoln chamou “os melhores anjos da nossa natureza”.

É dentro desse espírito que 56 jornais de todo o mundo se uniram sob este editorial. Se nós, com tão diferentes perspectivas nacionais e políticas, conseguimos concordar sobre o que deve ser feito, então certamente os nossos líderes também o conseguirão.

Os políticos em Copenhaga têm o poder de moldar a opinião da História sobre esta geração: uma geração que encontrou um desafio e esteve à altura dele, ou uma geração tão estúpida que viu a calamidade a chegar, mas não fez nada para a evitar. Imploramos-lhes que façam a escolha certa.

Esperemos que as pessoas que têm meios de fazer a diferença, os políticos, os governantes, tomem medidas e, principalmente, as apliquem. É tarde demais para salvar o planeta, mas é melhor conseguirmos fazê-lo sobreviver mais algum tempo, caso contrário arriscamo-nos a assistir ao seu fim.

5.12.09

Desafio

Recebi um desafio da Four Simple Words. Continuar umas frases, publicar um selo e passar o desafio a outras pessoas. Nesta última parte eu sou terrível, não tenho paciência para passar desafios. Mas agradeço a quem mo passou :P

a) Eu já... desisti de tentar entender as pessoas.
b) Eu nunca... andei de avião.
c) Eu sei... muito menos do que o que gostaria de saber.
d) Eu quero... fazer tanta coisa e não tenho tempo nenhum.
e) Eu sonho... viajar, ler e ter-te ao meu lado :)

1.12.09

1º de Dezembro

Hoje, 1º de Dezembro, comemora-se a restauração da independência de Portugal. Melhor dizendo, comemoram aqueles que nela acreditam. Não faço parte desse grupo.
A ideia do terrível domínio filipino e do heroísmo da restauração da independência, apesar de ter antecendentes, foi principalmente defendida e inculcada na sociedade durante o Estado Novo. O Estado pretendia mostrar a capacidade de sobrevivência dos portugueses, que se teriam revoltado contra a governação espanhola e restaurado o legítimo rei. Infelizmente isso é falso.
Não tenho jeito para me armar em José Hermano Saraiva e contrair tudo o que já foi dito sobre tudo da história. Mas neste caso a minha teoria tem bases documentais, pelo que me arrisco a dizer que é um bocadinho mais verdadeira que as outras.
Depois da morte dos herdeiros directos, o trono português ficou vago. E, por muito que não agrade a muita gente, o pretendente mais legítimo era Filipe II, rei de Espanha e dos Países Baixos. E era o mais legítimo porque a sua mãe, Isabel de Portugal, Imperatriz do Sacro Império Romano-Germânico, era portuguesa, nascida e criada no Paço Real de Lisboa, filha do rei D. Manuel I. E por acaso, se virmos bem, Filipe II de espanhol tinha pouco: a mãe era portuguesa, o pai era, tendo em conta as fronteiras políticas actuais, belga.
Mas mais ainda que a origem de Filipe II, importa a forma como governou. Portugal, entre 1581 e 1640, foi um estado autónomo, com istituições independentes de Espanha, mas governada pelo mesmo rei. Era o único ponto onde a administração se encontrava. E não pensem que os portugueses se mostraram muito indignados com a governação de um rei que não nascera em Portugal. Pelo contrário, aceitaram essa novidade sem grandes problemas.
A suposta restauração foi feita apenas por um grupo de nobres descontentes, que receberam o apoio popular porque qualquer movimento recebia o apoio popular (perdoem-me, mas é a verdade, os portugueses vão em tudo o que lhes digam para fazer).
Eu não tenho aquela ideia de que, se Portugal tivesse continuado sob a governação espanhola, hoje estaria melhor. Nem isso me preocupa. Mas acho que não devemos odiar os espanhóis por uma má interpretação da história.

Dia Mundial da Sida


Hoje assinala-se o Dia Mundial da Sida. Pensei em escrever comemora-se; mas uma coisa destas não se pode comemorar. E não percebo porque lhe chamam dia mundial da sida, deveria ser contra a sida.
Os primeiros casos de SIDA, Síndrome da Imunodeficiência Adquirida, que se desenvolve depois de contraído o Vírus da Imunodeficiência Humana, VIH, remontam a 1930, mas a doença começou a espalhar-se em grande nível na década de 80. Infelizmente foi durante muito tempo vista como uma doença de homossexuais, o que tem vindo a mudar devido aos números recentes de infecções, que mostram exactamente o contrário.
Infelizmente os números continuam a ser aterradores: em Portugal existem 35 mil casos de infecção conhecidos desde 1983; a nível mundial, já matou mais de 25 milhões de pessoas.
Não há forma de voltar atrás e impedir a existência da doença. Mas há formas de protecção, coisas tão simples, que podem evitar males tão grandes. Há que ajudar aqueles que já foram contaminados, e evitar, com gestos quase banais, que hajam novos contágios.

"O sino a tocar na torre da igreja fica bem, mas o muezzin a cantar no minarete já chateia"

Os partidos de extrema-direita da Suíça, que é um país democrático e livre, promoveram a realização de um referendo onde a população decidiu pela proibição ou não da construção de minaretes, que para quem não sabe são as torres das mesquitas, a partir das quais é feito o chamamento para a oração. As pessoas foram votar no referendo, porque a Suíça é um país livre e democrático, e ninguém é impedido de votar. E do referendo saiu a decisão de que não serão construídos mais minaretes na Suíça, porque a Suíça é um país democrático e livre, que não impede ninguém de escolher a sua fé, a sua religião e de o mostrar publicamente. Ah espera, afinal não. Porque proibiram. São democráticos mas proibiram. E vocês agora perguntam porquê. Pois, não era pelos muitos minaretes que tapavam a vista para as vaquinhas nos Alpes, porque existiam apenas 4, num total de 180 mesquitas no país. Não, foi mesmo por puro preconceito. As torres das igrejas não são proibidas, e existe uma a cada esquina, tanto lá como cá. Mas os minaretes, que eram quatro num país inteiro, foram proibidos.
Tenho muito medo daquilo em que a Europa se está a tornar. Tenho mesmo muito medo.

"Queguida, vou dague uma entguevista, a menina tem de legue, só vou dizegue coisas espeguetas"

Às vezes tenho a nítida sensação de ser uma pessoa bastante estúpida, porque leio ou ouço coisas e simplesmente não as entendo. Hoje aconteceu isso. Vi este título: D. Duarte favorável a figura legal para união de casais homossexuais , e sinceramente não entendi. Não consigo perceber o que raio é que o senhor Duarte (os monárquicos fanáticos podem exaltar-se à vontade, mas a monarquia acabou e eu não trato ninguém por Dom) tem a ver com o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
A notícia, felizmente, é curta, porque se fosse longa até me dava dores aguentar tanta parvoíce junta. Fiz o esforço de ler e o que é que eu vi? As ideias bacocas do costume. A primeira coisa que me faz comichões é dizerem que ele é "o herdeiro do trono português". E pior do que isso é o senhor acreditar realmente que é mesmo herdeiro. Ora bem, o senhor é primo em sexto grau do último rei de Portugal, que foi destronado vai fazer 100 anos. Para mim esta frase diz tudo. Ele não só é primo num grau tão afastado que eu nem sabia que existia, como se reivindica herdeiro de um trono que acabou há 100 anos. É preciso ser muito ceguinho para não ver que anda à caça de gambuzinos. Mas pronto.
Depois o senhor debita as tretas do costume, que o casamento é "um conceito que foi desenvolvido durante milhares de anos", que serve para "proteger os filhos" (eu adoro que digam isto e depois dêem de caras com milhares de casais neste país e no mundo que escolheram não ter filhos), parvoíces assim.
Isto tudo para chegar à conclusão de que "deveria haver uma outra figura legal". Podem casar-se, desde que não se chame casamento. E com isto voltamos à história do piaçaba, e ao meu sonho recorrente de pedir a minha namorada "em piaçaba". Ou em semáforo. Ou em vrrnhec. Tanto faz. Desde que não se chame casamento.
Eu gostava que esta gentinha que não tem, obviamente, nada para fazer, se metesse nas suas vidinhas tristes e resignadas e deixasse de tentar destruir a felicidade dos outros. Porque eu não fiz mal a ninguém para ter de viver num mundo onde não sou respeitada.

29.11.09

"Homem mata a tiro a mulher e militar da GNR"

A semana passada a lista ia em 25 mulheres mortas pelos maridos, namorados ou companheiros. Não sei quantas mais morreram entretanto. Hoje, voltou a acontecer. Não há comentários possíveis a fazer.
Aqui está tudo o que eu gostaria de ter escrito sobre isso.

28.11.09

"Has legalized same sex marriages led to more homossexuals? I think that in the Broadway it has."

Tenho a infelicidade de não fazer parte da parte da população possuidora de tv cabo, ou satélite, ou lá como se chama. Por isso quando dou de caras com um programa transmitido nesses canais fico como um burro a olhar para um palácio, completamente embasbacada. Mas neste caso não pude. A minha defesa dos valores da sociedade, o meu conservadorismo não me permitem. Porque, como diz o senhor no final do vídeo, that is disgusting!
The Daily Show With Jon StewartMon - Thurs 11p / 10c
Mass. Hysteria
http://www.thedailyshow.com/
Daily Show
Full Episodes
Political HumorHealth Care Crisis



(visto aqui)
(por favor leiam isto como ironia, como é óbvio eu não concordo com aquele senhor paspalho que diz que a qualidade de vida piorou com a aprovação do casamento entre pessoas do mesmo sexo)

25.11.09

Dia internacional pela eliminação da violência contra a mulher

Hoje, 25 de novembro, é o dia internacional pela eliminação da violência contra a mulher. A semana passada morreram três raparigas portuguesas, assassinadas pelos próprios namorados. É irónico. Tristemente irónico.
Felizmente nunca fui vítima de violência numa relação, e por isso não entendo. Não entendo as raparigas e mulheres (e homens, porque os há, mas em percentagem reduzida) que são agredidas, seja física ou psicologicamente, e se calam. Não entendo as mulheres que aguentam anos de maus tratos, maus tratos esses que, por vezes, começam na juventude, durante o namoro, e se prolongam. Não me venham dizer que é por causa dos filhos, ou do dinheiro. Os filhos são felizes se os pais se odeiam e maltratam? Duvido muito. E não há dinheiro que compre a dignidade humana.
Não entendo como é que estas mulheres não viram costas ao primeiro gesto, à primeira ameaça. Não tenho moral para falar, é certo. Nem quero ter. Ainda assim continuo a achar que não iria tolerar violência vinda de quem amo.
Nem vou dizer que não entendo a parte de quem agride, porque isso nem tem entendimento possível, é estupidez humana ao mais alto nível.
O que eu também não entendo são as pessoas que sabem de casos de violência doméstica, que por vezes os presenciam, e não fazem nada. Para quem não sabe violência doméstica é crime público: qualquer pessoa que tenha conhecimento de uma situação dessas pode, e deve, fazer queixa às autoridades. Mas não fazem. Porque "entre marido e mulher não se mete a colher". Não fazem porque são pessoas igualmente estúpidas, que gostam de saber que os outros sofrem sem agir. Há uns tempos li um artigo sobre mulheres da "alta-sociedade" (não sei o que isso seja, mas transcrevo) agredidas pelos maridos; as famílias sabiam das agressões, algumas das quais de uma brutalidade indescritível, e não faziam nada. Porque não queriam enfrentar as opiniões dos outros. Porque as opiniões alheias são sempre mais importantes que a felicidade própria.
Tenho pena. Tenho pena das mulheres que vivem situações dessas e cujo medo as paralisa, que não conseguem escapar a esse ciclo de violência. Tenho pena dos filhos que assistem a essa violência. E tenho nojo, tenho muito nojo, da sociedade que continua a tolerar estes comportamentos.
E para quem continua a achar que é a ordem das coisas, "sempre foi assim, é assim que deve ser", fica aqui a lista de mulheres assassinadas pelos maridos, namorados ou companheiros, só este ano.

17.11.09

Debate sobre o referendo do casamento entre pessoas do mesmo sexo

(Aviso: quem não tem paciência para textos longos é melhor ficar por aqui. Este vai ser bem longo.)
Ontem foi transmitido na RTP1 o debate Prós e Contras, sobre o tema “Casamento homossexual: a referendar?”. Eu não pude ver em directo, mas a minha namorada, que é uma querida, gravou, e vimos hoje (obrigado, amor). Uma parte de mim tinha decidido não ver este debate, porque já sabia que ia ficar com a úlcera a latejar. Mas a outra parte, que acabou por vencer, gosta de se manter informada sobre este e outros assuntos e, mais ainda, é irremediavelmente curiosa.
Ouvi muita coisa. Muitas coisas com as quais concordei, muitas coisas com as quais discordei. Vi pessoas que muito admiro a defender as suas ideias; vi pessoas que não conhecia ou por quem não nutro qualquer admiração dizer puras barbaridades.
Antes de mais, houve um pormenor que me deixou logo com urticária: “casamento homossexual”. Esta expressão, que não sei quem foi a besta ortográfica que inventou, foi usada como título do programa. Mal usada, porque o casamento não é homossexual. O casamento é um contrato celebrado entre duas pessoas, que lhes concede uma série de benefícios e implica uma série de responsabilidades. Durante o debate, reparei que eram os membros do grupo contra a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo (é assim que se diz), e a favor do referendo, quem usava essa expressão. Os membros do grupo contrário, a favor da legalização do casamento e contra o referendo, falavam correctamente. E gostei disso.
Comecei por ver Ribeiro e Castro afirmar que, segundo a Declaração Universal dos Direitos do Homem, “a família é a célula fundamental da sociedade”; é verdade. Mas sinceramente, na minha humilde opinião, não vejo em que é que a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo afecta, seja de que forma for, a família.
O mesmo senhor usou mais que uma vez a expressão “sempre foi assim, é assim que deve ser”. Ora seguindo esse raciocínio, os africanos sempre foram escravizados, as mulheres sempre foram subjugadas aos homens, os trabalhadores sempre foram maltratados pelos patrões, e é assim que deve ser (sublinho que esta não é, evidentemente, a minha opinião). Esta lógica é, para começar, estapafúrdia e, para acabar, profundamente preconceituosa.
Depois surgiu, vindo da mesma pessoa, a frase que para mim foi o momento alto da noite: “a relação da família não tem nada a ver com afectos”. O senhor tentou desmentir que esta estupidez lhe tinha saído da boca, mas teve a infelicidade de ficar gravado, e de ter tido milhares de testemunhas. Ah, com que então a família não tem nada a ver com afectos. Pois, faz sentido. Não há pais que gostem dos filhos. Não há casais que se amem. Não, isso é tudo um mito.
Depois apanhei uma frase também fantástica, ainda de Ribeiro e Castro: “o casamento não tem só a ver com quem casa, tem a ver com terceiros”. E isto é outra coisa que eu não fazia ideia. Eu podia jurar que quem decidia se e porquê casava eram quem casava, mas pelos vistos estou profundamente errada. É que antes de casar eu tenho de ir perguntar à cidade toda o que têm a dizer da questão. Pois claro, eu preciso de saber a opinião do senhor da padaria.
Outro brilharete veio de Pedro Picoito, que chamou à defesa da legalização do casamento uma “reivindicação identitária tribal”, dito em tom pejorativo. Outra completa novidade para mim, pelos vistos faço parte de uma tribo e nem sabia.
Nem me vou referir às várias declarações de Jorge Bacelar Gouveia, porque foram simplesmente inomináveis, de uma homofobia pavorosa.
Para terminar a análise das declarações do grupo do sim ao referendo, falou Isilda Pegado. Ora a teoria é: o supremo interesse da criança justifica a discriminação na possibilidade de adopção por casais do mesmo sexo. Perceberam? Traduzindo, os homossexuais não sabem educar correctamente uma criança. É isto que a senhora defende. Os homossexuais não sabem dar amor, carinho, uma casa, uma família, a uma criança. Inacreditável.
Ao grupo do não ao referendo, não tenho críticas a fazer. Concordo com eles, ponto por ponto. Surpreendi-me pela positiva com as afirmações de Jorge Lacão. Aprendi com as referências jurídicas de Isabel Moreira. Vibrei com as declarações de Miguel Vale de Almeida. Admirei todos os outros, Gabriela Moita, Paulo Côrte-Real, Heloísa Apolónia, a representante da AMPLOS, o representante da Novos Rumos, e aqueles que agora me falham. Mostraram que não se pode pretender referendar direitos, que não se pode pretender usar esse argumento para disfarçar preconceito, mostraram como este tema é, mais que actual, uma coisa que nunca deveria ter sido sequer discutida, porque já deveria de fazer parte das leis há muito tempo.
Agora a minha declaração de princípios: sou homossexual; sou a favor da legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo; sou contra o referendo, mas votarei caso este seja feito, e votarei pela legalização; e tenciono um dia casar.

Ficam aqui os links da Declaração Universal dos Direitos do Homem (artigo 16.º) e da Constituição Portuguesa (artigo 13.º), que foram referidos várias vezes.

9.11.09

Como diria o padre presidente de não sei o quê "Meuzzz filhozzz, fuzzzam dozzz gayzzz"

"O casamento entre pessoas do mesmo sexo é um direito que deve ser reconhecido por uma sociedade que defende a igualdade e rejeita a discriminação. É um passo em frente num país que progressivamente se liberta de preconceitos e evolui no sentido da tolerância. Não existe entre nós um consenso sobre a questão, como é sabido. Mas é importante que o debate seja elevado. E que decorra no local adequado, que é o Parlamento e não o referendo. Foi um tema da campanha eleitoral e é aos deputados que compete legislar."
Lido hoje no Editorial do Público
Minhas gentinhas que se arrastam por esse país fora com as suas cabeças cheias de teias de aranha, saudações a Salazar e outros saudosismos afins, custa muito entender estas frases? Custa? Custa muito legalizar o raio do casamento? Deixem-se de tretas e deixem os outros ser felizes.

O muro de Berlim caiu há 20 anos


Faz hoje 20 anos que caiu o muro de Berlim. Eu era nascida mas não tenho idade para me recordar disso: não assisti pela televisão àqueles momentos, não senti que alguma coisa mudava, não vi que começava uma nova era. Sei o que aprendi na escola, mal e porcamente, sei o que vejo agora na televisão, o que leio.
Mas não entendo. Não entendo que mentes, por muito que pertencessem a outra época, a outra cultura, a outro contexto histórico, que mentes perversas foram essas, que decidiram dividir uma cidade e, simbolicamente, o mundo, a meio. Houve famílias separadas durante os 28 anos da sua existência, desde a madrugada de 13 de agosto de 1961 até à madrugada de 9 de novembro de 1989. Pelo menos 80 pessoas foram mortas a tiro enquanto tentavam atravessar o muro.
Por uma discórdia política, não me venham com complicações que a realidade é essa, uns eram capitalistas, os outros socialistas, por uma questão de não concordar com as ideias do "vizinho" construiram um muro de não sei quantos quilómetros, dividiram o país e a Europa a meio, mataram quase uma centena de pessoas, feriram tantas centenas. Não entendo gente assim.
(imagem da construção do muro em 1961)

8.11.09

Declarações de amor incomuns

Percebo que a minha namorada está realmente viciada no farmville quando ela entra à socapa na minha conta do facebook e faz isto:(a qualidade não é grande coisa porque mexer em imagens não é a minha especialidade)

Pode ser estranho, e um bocadinho piroso. Mas eu gosto, é querido, é carinhoso. E eu gosto muito dela, e isso é que interessa.

"Amor, queres piaçaba comigo?"

Estou cansada da polémica que andam a criar à volta da legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Não é cansada. É farta. Já não é só cansaço, é uma coisa muito mais funda, que provavelmente em pouco tempo me irá causar uma úlcera duodenal. Estou farta da burrice dos argumentos, estou farta das ideias mesquinhas de gente que acha piada manter a infelicidade dos outros, estou farta dos portugueses em geral e de uma boa parte em particular.
Agora vem aí uma multidão dizer "mas toda a gente tem direito a ter opiniões diferentes, temos de as respeitar". Pois é, toda a gente tem direito a opiniões diferentes. Tenho pena que haja quem não veja que as suas opiniões são estúpidas e sem fundamentos, mas mesmo assim têm direito a tê-las; e eu respeito-as: por isso é que ainda não dei um murro nas trombas de quem me vem com a conversa homofóbica, porque respeito as opiniões diferentes.
Mas da mesma maneira que haja quem tenha direito de dizer que eu sou uma anormalidade, que se casar vou deitar abaixo a "instituição" do casamento, que mereço ser infeliz (já para não falar de quem secreta ou publicamente defende que os homossexuais deviam ser fuzilados), eu tenho o direito de dizer que essas pessoas têm ideias saídas da Idade Média, fundamentadas nos dogmas incomprováveis da Igreja Cristã, e que uma pequena análise lógica e científica rebate facilmente.
Mas essas ideias, essas pessoas, magoam. Claro que magoam. E é isso que me cansa, que me farta. Eu não sei se vou casar. Houve uma altura da minha vida em que disse que isso não iria acontecer. Depois conheci alguém com quem até gostaria de casar. Para mim o casamento é um contrato celebrado entre duas pessoas que garante direitos e implica deveres. Mas pela primeira vez na minha vida vejo que pode também ser uma prova de amor. E eu gostava de dar essa prova de amor.
Vi num comentário a um post de outro bolg uma senhor dizer que gostava de pedir o companheiro em casamento, e não ter de lhe perguntar se ele queria "celebrar um contrato de união de facto com direitos similares ao casamento comigo", algo assim. Concordo totalmente. Nem vou falar da parte do dêm-lhe outro nome, porque para mim isso é pura estupidez. E não vou falar de mais nada.
Estou cansada desta gente, estou cansada deste país, estou cansada de quem defende que se referendem direitos. Quero os meus direitos, e quero casar com quem amo. Ponto final.

5.11.09

"Remember, remember, the 5th of november..."

Não me lembrava que dia era hoje. Calhei a ver o título de um post de um blog onde se referia o dia. E decidi "puxar a brasa à minha sardinha", para usar uma expressão muito portuguesa. Ou seja, decidi falar de História.
Hoje é dia 5 de novembro. Passaram 404 anos desde que, na noite de 5 de novembro de 1605, um grupo de conspiradores tentou fazer explodir o Parlamento em Londres, assassinando uma parte dos lordes e o rei Jaime I. Esse acontecimento ficou conhecido como a Conspiração da Pólvora (a página que aqui fica está em inglês porque a página em português é uma bela de uma porcaria, e sim, eu sei que não se deve usar a wikipedia, mas é o que tenho à mão). Perguntam vocês porque é que isto merece ser relembrado. O que torna especial essa conspiração, que acabou por falhar, é o seu motivo.
A Inglaterra era protestante desde 1534; desde essa altura os reis tinham alternado entre católicos e protestantes, mas Jaime I era profundamente protestante, reprimindo brutalmente os católicos. Os conspiradores de 1605, liderados por Robert Catesby, pretendiam pôr no trono a filha do rei, que seria religiosamente tolerante. O seu plano falhou porque, nessa noite, quando Guy Fawkes estava a terminar a tarefa de pôr os explosivos nos alicerces do edifício do Parlamento, um grupo de guardas apanhou-o. Tanto ele como os restantes conspiradores foram julgados e condenados à morte por enforcamento.
Mas tentaram. Lutaram por aquilo em que acreditavam. É claro que era um mundo diferente, muito diferente daquele em que vivemos. Mas ainda assim, a lógica principal mantêm-se. Lutar por aquilo em que acreditamos.

E já agora, porque acho bonito, fica aqui uma rima popular criada na época sobre a Conspiração de Guy Fawkes:
"Remember, remember, the 5th of November
The gunpowder, treason and plot;
I know of no reason, why the gunpowder treason
Should ever be forgot."


E para quem não tem paciência para História porque acha uma seca, vejam o filme V for Vendetta, de James McTeigue, com Natalie Portman e Hugo Weaving, que trata desse tema de uma forma diferente, e que é um dos melhores filmes que já vi.

30.10.09

"Não, não podem casar, porque casar toda a gente vai sair caro, julgam que isto são as noivas de S. António ou quê?"

Hoje apeteceu-me comprar o Público. Não é meu hábito, só o leio em certos dias porque o distribuem gratuitamente na minha faculdade. Mas hoje ia a passar em frente a uma papelaria e lembrei-me que com o Público vinha o ípsilon, e eu gosto do ípsilon. E comprei. E nas últimas páginas dei de caras com um artigo de opinião.
O autor é um senhor chamado Jorge Bacelar Gouveia, professor catedrático de Direito e deputado à Assembleia da República pelo PSD e, confesso a minha ignorância, pessoa de quem eu nunca tinha ouvido falar. Mas eu, como até estou benevolente hoje, acredito que seja um senhor muito inteligente e culto, de uma sabedoria arrasadora para os meus padrões. Só que o senhor teve a triste ideia de escrever sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo. E isso deixou-me logo com pele de galinha.
Então vamos lá analisar os pontos de discórdia.
1. Não se diz casamento gay: o casamento não é gay, porque não tem orientação sexual, é uma instituição legal, um contrato escrito; diz-se casamento entre pessoas do mesmo sexo.
2. O argumento usado é aquele mais comum e sem piadinha nenhuma, "(...) como se Portugal, no estado em que está, não tivesse outras prioridades(...)". Meu caro senhor Gouveia, Portugal tem muitas prioridades, e esta é uma delas; e caso ainda não tenha percebido Portugal não vai sair do estado em que está, porque está assim desde o século XII; por isso vamos tratar deste assunto enquanto é tempo, para evitar mais mortes (sim, porque há mortes, não julguem que isto é um tema de pouca importância).
3. O senhor vem todo indignado dizer que já que querem mudar a lei, então façam referendo, porque se fizeram para a questão da despenalização do aborto também têm de fazer para isto. Eu acho piada esta conversa vinda de um professor de direito, porque eu, que não pesco muito de direito, tenho aquela ideia, que devo ter apanhado a ler jornais, de que os deputados são representantes eleitos pela população, e que o referendo só deve ser usado em situações de extrema necessidade. Ora bem, se existe a possibilidade de a lei ser votada no Parlamento, e neste caso existe a possibilidade de ser aprovada, vamos fazer referendo para quê? Ah pois, vamos fazer referendo porque só depois de as pessoas terem posto lá a cruz é que repararam que o partido que escolheram tem ideias diferentes das suas. Tivessem pensado nisso mais cedo.
4. (E este eu adoro mesmo) "(...) as formações partidárias que promovem o casamento gay dão liberdade de voto aos deputados, impedindo assim que os cidadãos, através do seu prévio voto legislativo nas urnas, pudessem ter obtido um antecipado conhecimento da posição oficial final sobre o assunto por parte de cada partido no momento da votação do respectivo projecto de lei." Vamos ver se eu entendi. Os partidos que promovem o casamento entre pessoas do mesmo sexo serão, seguindo o raciocínio do senhor, PS, PCP e BE. Todos eles avisaram que caso a lei fosse proposta para aprovação na Assembleia iam votar a favor. E fizeram esse aviso antes das eleições. Mas o senhor diz que os deputados podem mudar de ideias. Então se podem mudar de ideias, votam contra. Que parecia que era o que o senhor queria, porque o texto só mostra que ele seja um homofóbico disfarçado. Mas o senhor está indignado com isso. Olha, estou confusa, o que é que o homem quer afinal?
Sobre este texto fantástico, que eu vou emoldurar e pendurar na parede do meu quarto, ao lado dos textos do senhor João César das Neves, fica um comentário, que eu acho muito bom, do Daniel Oliveira: É prioritário dizer que isto não é prioritário.

27.10.09

O C. estava sempre lá. Todos os dias, estava sempre por perto. Agora não vai estar, durante uns meses. Eu não sabia que ele me iria fazer tanta falta. Não sabia que gostava tanto dele. É pena só descobrir isto nas piores situações.

26.10.09

I don't like mondays...

Às vezes um dia normal torna-se inesperadamente num dia muito mau, a vida dá-nos uma grandessíssima bofetada. E nós nunca estamos preparados para isso.
Soube hoje que um bom amigo meu está gravemente doente. Não tenho forma de o apoiar, e nem sei como o fazer. Só posso esperar.

25.10.09

"Ó Zé, vai pôr a mesa. Agora não mulher, tenho de ficar a olhar para a televisão como um vegetal".

Eu tenho um problema com homens. É a forma mais simples de começar a explicar isto. Tenho um problema, possivelmente derivado do péssimo exemplo masculino que tive, e que me causa um profundo descrédito nos homens. A minha namorada tem uma vertente de psicóloga, e diz que isto se deve ao facto de eu considerar a mulher muito superior ao homem, e daí achar que nenhum homem merece uma mulher. O resultado, seja qual for a causa, é o facto de a grande maioria dos homens me irritarem solenemente e não conseguir ver neles qualidades. Podem dizer que eu tenho uma fobia qualquer, não me interessa.
Este texto deve-se a ter assistido a várias situações, nos últimos tempos, em que alguns homens mostram não dar valor nenhum às respectivas esposas. O último desses casos foi uma situação em que a mulher estava a fazer uma coisa, uma coisa trabalhosa, digamos, e o homem estava sentado, especado a olhar para o porta-chaves. A pensar em coisas interessantíssimas, sem dúvida alguma.
Isto dá-me nervos. Dá-me nervos e cansa-me e deixa-me pior que estragada. Porque raio é que para uma quantidade significativa dos homens portugueses (eu sei que não é só em Portugal, mas é o único povo que conheço bem) elas trabalham enquanto eles olham?
Há aquela resposta mais comum, que eu adoro, de que o homem tem um emprego, “ganha o dinheiro”, por isso não precisa de mexer uma palha em casa. Mas se ambos trabalham, e quando chegam a casa a mulher é que faz tudo, como fica a situação? Depois dizem que os homens não têm jeito para tarefas domésticas. Ninguém nasce ensinado, mas aprende-se. E há mais argumentos, todos eles de um interesse extremo e facilmente rebatíveis.
O que me leva à conclusão óbvia: os homens não fazem nada porque não querem, porque não lhes apetece e, mais importante que tudo, porque a sociedade lhes tolera isso. E é esse último pontinho ínfimo que me deixa os prismas todos desalinhados: a sociedade aceita isso, aceita que as mulheres trabalhem e os homens assistam.
Claro que eu não sou perfeita, mas dou valor à minha namorada. E gosto de a ajudar, seja no que for. E não me imagino a ficar especada a olhar para o nada enquanto ela faz tudo e mais alguma coisa. Será que sou eu que tenho uma mentalidade assim tão avançada, sou eu que não faço sentido?

24.10.09

"Querida, não te importas de vir mudar o pneu ao carro? É que afinal não tenho jeito para isto."

Ainda ontem falava de estereótipos e preconceitos da sociedade (post abaixo), e não é que mais uma vez me sinto cheia de urticária pelo mesmo motivo? São para aí nove da noite e começa um programa na SIC, não sei quantos em casa, não apanhei bem o nome. Objectivo do programa, mostrar as diferenças entre homens e mulheres. E pelo meio de muita parvoíce, metem umas quantas coisas científicas. Apanhei, por exemplo, a parte em que fazem malas. E como os três homens que estavam no estúdio eram relativamente organizados, fica logo ali provado que os homens são mais arrumados que as mulheres. Eu adoro estas coisas.
Vamos a exemplos que eu conheço. Eu safo-me a mudar pneus e consigo ver o óleo do carro. Segundo as pessoas desse programa eu sou o "homem da relação". Mas eu também tenho algum, pouco é certo, mas algum jeito para cozinhar. Então também sou a "mulher da relação". Meu deus!! Segundo essa gente triste eu sou tudo na relação.
Por favor, deixem-se de tretas. Cada pessoa é uma pessoa, com as suas características. Não há duas pessoas iguais, toda a gente conhece a frase. Por isso não arranjem mais estereótipos parvos para homens e mulheres, para adultos e crianças, para tudo e mais alguma coisa.

23.10.09

"Não querido, não podes brincar com bonecas, porque isso é para meninas e não queremos que tu sejas maricas."

Eu sou uma pessoa muito complicada. Melhor ainda, muito comichosa. Tenho opiniões sobre quase todos os assuntos, e adoro pô-las aqui, quer sejam lidas ou não.
Desta vez, o que me deixam com uma certa urticária, foi uma iniciativa para, supostamente, o divertimento das crianças. Ligo a televisão e no programa da manhã da SIC estão a falar de um espaço inaugurado há uns meses onde, dizem, as crianças vivem "a maior diversão das suas vidas". Penso eu, deve ser um sítio fantástico. Nesse dito sítio as crianças brincam. Óptimo, essa é a melhor coisa de ser criança - passa-me pela cabeça. Mas depois a coisa perde a graça. Porque nesse sítio as crianças "experimentam profissões". Ou seja, elas não têm a maior diversão da sua vida ao brincar pelo simples divertimento que brincar pode provocar (e todos sabemos que brincar é sempre bom). Não, elas divertem-se sendo transformadas em pequenos adultos. Não brincam porque sim, brincam porque têm de treinar para o futuro.
Isto não me agrada nada. Eu, pelo que me lembro da minha infância, brincava porque era giro, era divertido, tinha piada. Não porque assim aprendia. Ou porque assim me preparava para o futuro. Eu queria lá saber do futuro. Aquelas criancinhas têm 5 anos, são feitas de sonhos, não de projectos, ou de ideias que se vão invariavelmente tornar realidade. Eu, na minha infância, quis ser guarda-redes, mecânica, camionista, e mais umas quantas coisas. E hoje não é nada disso que faço.
Mas pronto, esta parte fez-me confusão, mas até se aceitava. Agora o resto. Existem, se os meus ouvidos não falharam, cerca de 50 profissões disponíveis nesse espaço. Mas eu acho que a escolha não é bem feita. Duvido muito que entre essas esteja técnic@ de uma agência funerária, técnic@ da recolha do lixo, técnic@ de limpeza de casas de banho públicas. Essas profissões são tão legítimas como qualquer outra, mas não têm graça. Por isso não são apresentadas às crianças. Se os responsáveis querem ser correctos, rigorosos, devem mostrar de tudo um pouco, quer seja fixe e colorido e interessante, quer seja prático e útil e às vezes chato.
E a outra coisa que me deixou com uma certa irritação, é a contínua discriminação por género. Como é que no século XXI, os portugueses continuam a ter esta mentalidade tacanha de que há profissões distintas para homens e para mulheres. O grupo de crianças que estava em estúdio a ser usadas como exemplo era formado por dois rapazes e duas raparigas. Não perguntaram aos rapazes se queriam experimentar brincar com um/uma maquilhador/a. Não, encaminharam-nos logo para o piloto de corridas. E vice-versa. Eu não entendo isto, porque é que as crianças têm de fazer uma coisa, brincar de uma determinada forma, por puro preconceito dos adultos. Eu odiava bonecas e brincadeiras em que fosse suposto tomar conta de bebés e brinquedos para lavar a louça ou cozinhas. Eu adorava jogar futebol, e adorava carros em miniatura. E felizmente nunca ninguém me impediu de fazer aquilo que realmente me divertia. Mas há quem impeça os filhos de se divertirem, porque "isso não é para rapazes, é para raparigas", ou o contrário.
Esta cansa-me, cansa-me mesmo muito.

22.10.09

Também não era preciso tanto. Esta gente adora bater no ceguinho.

Esta gente passa-se. Eu entendo, ficamos um bocado agoniados com a saída do José Saramago (andar um bocadinho para baixo para ver o comentário a isso, se faz favor, já sabem como se faz), eu pelo menos fiquei um tanto ou quanto mal disposta, mas também tenho andado adoentada, se calhar é disso. Mas não é preciso exagerar. O pior é que o português típico exagera sempre. E isso chateia. Primeiro vem um tipo que pelos vistos é deputado do PSD no Parlamento Europeu, e de quem só 0,1% da população é que ouviu falar (de qualquer forma, não votei nele, as pessoas em quem votei sei pelo menos os nomes), um tal de Mário David, e o senhor vem dizer que José Saramago devia "renunciar à cidadania portuguesa". O homem não devia estar bem naquele dia, acontece, às vezes temos dias assim, enfim, dá-se-lhe o desconto.
Mas não é que agora surge António Sousa Lara renascido das cinzas para atacar mais uma vez? Para quem não sabe ou não se recorda, Sousa Lara foi o sub-secretário de Estado da Cultura, um cargo de elevadíssima importância, que em 1992 impediu que O Evangelho Segundo Jesus Cristo, de Saramago, concorresse ao Prémio Literário Europeu, porque era uma obra que punha em causa uma série de dogmas da Igreja Católica (1). Ora este senhor vem agora dizer que Saramago "está ao nível de Berlusconni". Eu não sei o que é que o Saramago pensa desta frase, mas para mim isto é um insulto pior do que me mandarem a certos sítios, e merecia um par de lambadas bem assentes em quem o disse. Mas Saramago é um senhor respeitável, que decerto reagirá com muito mais sensatez do que eu (visto que eu não tenho disso).

Mas agora a sério, esta gente pensa no que diz quando está a falar? É que não devem pensar. O José Saramago pode não ter tido um momento particularmente feliz com o que disse, mas querer que ele renuncie à cidadania e dizer que ele é como o Berlusconni é abusar. Principalmente vindo de dois políticos ou ex-políticos.


(1) Só para espicaçar um bocadinho, devo também dizer que o senhor Sousa Lara foi condenado a dois anos e meio de prisão, com dois anos de pena suspensa, por administração danosa enquanto vica-reitor da Universidade moderna.

21.10.09

Crente praticante, crente não praticante, mas o que raio é que isso interessa?

Nos últimos dias, devido, em parte, à questão das declarações de José Saramago, e em parte a algumas aulas que tenho tido (para que melhor se entenda, uma das cadeiras que tenho este semestre é História e Civilização do Islão), tenho ouvido várias vezes os conceitos de católico, crente e praticante. E acho uma piada doida a essa noção de católico praticante.
Para começar porque o cristianismo católico é a única vertente de uma religião em que se põe a questão de ser ou não praticante. No Islão, ou é-se muçulmano ou não. Os judeus são judeus tanto pela fé como pela herança cultural. Os cristãos protestantes o mesmo. Mas os cristãos católicos têm essa ideia, para mim sem sentido, de que se pode ser crente sem ser praticante. Do meu muito humilde ponto de vista, o que interessa é que se tenha fé nessa religião. Agora seguir ou não todos os rituais, isso é uma questão de sentido prático, que para mim não tem necessariamente a ver com a fé.
E outra coisa que me dá nervos. "Sou católico porque me baptizaram". Essa não me entra. Que eu saiba pertence-se a uma religião por fé, não por tomar banho numa pia baptismal. Eu fui baptizada, porque os meus pais quiseram, fiz a primeira comunhão, porque os meus pais quiseram, e não é por isso que sou católica, ou sequer cristã. Devo andar mesmo perdida, porque me parece que muita gente diz pertencer a uma religião como diria que vai ali comprar tabaco. Ou então sou eu que ando com princípios muito rígidos.

20.10.09

Qualquer dia dizem que o Papa é o anti-cristo. Tem piada, acho que já ouvi isso em algum lado... Ah, pois, foi na Idade Média.

O Saramago teve azar comigo. Tive de ler O Memorial do Convento no secundário, por obrigação, e aquilo não me caiu bem no estômago. Aqueles parágrafos de quatro páginas, aqueles diálogos vírgula isto vírgula aquilo vírgula aqueloutro, não faz o meu género. Li uns poemas soltos e até não era mau, bonito, romântico, tinha a sua poesia. E várias pessoas em cujos gostos literários confio dizem-me que escreveu coisas muito boas, O Evangelho Segundo Jesus Cristo, O Ano da Morte de Ricardo Reis. Não sei, não li, mas acredito que sim.
Mas o senhor não precisava de vir dizer que a Bíblia é "um manual de maus costumes". Isso era desnecessário. Se ele não acredita, também não precisava de fazer as críticas que fez à Igreja Católica. Eu tenho cá as minhas opiniões sobre a Igreja, tenho as minhas crenças (ou a falta delas) e lido com isso à minha maneira. Mas respeito muito quem tem fé. Admiro mesmo essas pessoas, a fé dá-lhes uma segurança que eu nunca terei.
Há pessoas que com a idade julgam que podem dizer tudo o que lhes apetece. A minha avó sofre do mesmo. Mas a verdade é que não podem. Guardem as suas opiniões para si. Ninguém lhes perguntou nada.

18.10.09

Hoje não sou maluquinha, mas quando nasci era.

Ainda sobre notícias que encontrei hoje, esta.
Ocorreu ontem uma "manifestação", no Largo Camões, inserida num conjunto de acções a nível mundial, com o objectivo de iniciar o processo de alteração do conceito de transexualidade, que ainda figura na lista das doenças mentais.
Isto fez-me uns comichões desgraçados. Porque eu não sabia que quem sente que quer mudar de sexo é considerado doente mental. Pensava que era uma pessoa como as outras. Como o senhor do café, como a rapariga do supermercado, como eu. Mas não. Os transexuais são doentes mentais, e eu, antes de 1990, também o era, uma vez que foi nesse ano que a homossexualidade foi retirada da lista de doenças mentais da Organização Mundial de Saúde.
Estamos no século XXI, 2009, e a transexualidade continua a ser considerada uma doença mental. Em Portugal, os transexuais não podem mudar de nome, porque a lei não lhes permite. Os homossexuais não podem casar com alguém do mesmo sexo. Há uma série de países no mundo em que a homossexualidade é considerada crime, sendo que em alguns é punida com pena de morte.
Isto magoa, magoa mesmo muito. Que haja gente tão estúpida no mundo. Que haja gente que sente prazer em destruir as vidas dos outros, em impedir pessoas de serem felizes. Há dias em que tenho muita pena de viver num mundo assim.

Vou chamar Torpécia à minha filha, nome mai lindo não há!

Hoje peguei no jornal e dei com esta notícia. A dita refere-se a um processo que se arrasta nos tribunais, iniciado por uma família que queria chamar ao seu filho Diego, e que não pode porque é proibido dar esse nome a uma criança portuguesa cujos pais não tenham origem estrangeira. O argumento é o de que "qualquer inversão desta relação entre nomes e nacionalidade é tida como perturbadora", sendo que neste caso o nome tem origem castelhana. Perturbadora é uma palavra interessante. Ver milhares de pessoas a dormir nas ruas deste pais é perturbador. Ver a falta de respeito que a grande maioria das pessoas mostra é perturbador. Um miúdo português chamar-se Diego não me parece particularmente perturbador. Eu, na minha enorme ignorância, acho que o miúdo não se vai sentir um espanhol puro, adepto do Barcelona e que só come tapas, por ter um nome de origem castelhana. E também me parece que tentar proteger a cultura portuguesa através de decisões jurídicas destas é simplesmente ridículo. Preocupem-se em reabilitar os monumentos nacionais ou alguma coisa assim, essas coisas sem importância nenhuma.
Mas achei interessante que fossem apresentados alguns nomes permitidos para registo na notícia, "Adonai, Vitiza, Solângia ou Pégui". O primeiro e o último são aportuguesamentos de nomes estrangeiros. Agora o segundo e o terceiro não são. Eu, por acaso, tenho conhecimento da origem do nome Vitiza, mas português não é e isso garanto: é um nome de origem visigoda, ou seja, germânica. E Solângia, que raio é isso?
Eu, como sou extremamente curiosa, decidi ir saber que nomes são permitidos. E fiquei parva. Diego não é permitido, mas Cizina, Geisa, Gabínio ou Rolende são, entre muitos outros. Vejam a lista. E aproveitem para rir. Umas boas gargalhadas fazem sempre bem.
P.S.:Não se pretende com este texto ofender pessoas que tenham nomes incomuns. Se algum dos leitores tiver um dos nomes aqui referidos, pede-se desculpa pela utilização.

17.10.09

6 meses. 183 dias. Todos maravilhosos.

Amo-te.

14.10.09

"Ai que me lembrei que sou português e tou tão chateado com o mundo inteiro"

Eu às vezes surpreendo-me a mim própria. Ainda há uns dias escrevia aqui uma coisa sobre o facto de gostar de Portugal mas não dos portugueses (como é óbvio não me vou dar ao trabalho de pôr o link, se querem ver andem com a página um bocadinho para baixo, não custa nada) e não é que tenho mais um argumento para aumentar ainda mais esse meu sentimento?
Há coisa de dois anos uma actriz brasileira, Maitê Proença (que, particularmente, acho que é boa actriz), fez um vídeo onde diz umas quantas parvoíces sobre Portugal e os portugueses. Nota-se que lhe faltam conhecimentos de história, de geografia, e um certo cuidado com determinados gestos. Mas pronto, é um vídeo que não me aquece nem me arrefece. Mas pelos vistos há milhares, se não milhões, de portugueses, que ficaram indignadíssimos; agora, dois anos depois!!!Ora vejamos: a Luísa Castel-Branco, por quem eu até tinha um certo respeito, diz "Que tal proibir-lhe a entrada no país?" (claro, é exactamente isso que eu faço quando gozam comigo, proibo que essa pessoa entre no meu país, não melhor, no meu continente, é isso, vamos impedi-la de entrar na Europa); uma série de comentários em vários blogs, cada uns piores que os outros, e que nem vale a pena ver; e para cúmulo, uma petição!! a exigir um pedido de desculpas, assinada, no momento em que escrevo, por mais de 2500 pessoas.
Agora, se não se importam, eu faço o favor de relembrar a essas pessoas que andam com vontade de fuzilar a Maitê, a forma como os brasileiros são vistos e tratados em Portugal: o brasileiro é ladrão, é corrupto, é preguiçoso, vem cá para roubar o trabalho dos portugueses (esta é das que eu mais gosto, dá-me uma vontade de rir), as brasileiras roubam os maridos das mulheres portuguesas, enfim, o diabo a quatro. Mas quando somos nós o motivo do gozo ou da piada fácil, já dói não dói?
Sei que a lei de talião não é politicamente correcta, olho por olho, dente por dente, mas esse vídeo e todos os outros tipos de gozação que os portugueses sofrem não são mais do que justos perante a forma como os portugueses têm tratado outras pessoas ao longo do tempo.

13.10.09

Fenómenos do Entroncamento

Ando a ver televisão a mais, só pode. Jornal da noite da TVI; especial sobre o jogo da Selecção Nacional amanhã. O jornalista Sousa Martins, em directo de Braga, cidade onde a Selecção se encontra, faz a reportagem; são oito horas e vinte minutos, vê-se que é noite cerrada. A palavra passa para uma jornalista, que se encontra junto ao Estádio D. Afonso Henriques, em Guimarães. "Em directo". E não é que ali é de dia? E não só é de dia, como parece que ainda é bem de tarde. Não fazia a mínima ideia que de uma cidade para outra mudava completamente o fuso horário.
Minha gente, não julguem que os espectadores são estúpidos.

11.10.09

Os meninos jogam à bola, as meninas brincam com bonecas, e eu devia ser um E.T., coitada de mim...

Há um programa na TVI, cujo nome desconheço, onde crianças vão mostrar os seus talentos. Antes iam cantar, agora fazem outras coisas, como tocar instrumentos musicais. Calhei a assistir à apresentação de uma rapariga de 14 anos a tocar bateria; a miúda tinha um jeito fantástico para aquilo. Depois de tocar uma música, foi falar com os apresentadores, Manuel Luís Goucha e Júlia Pinheiro. E a Júlia Pinheiro, esse poço de sabedoria, faz o seguinte comentário: "Mas isto [tocar bateria] não é para meninas!". A rapariga, que felizmente era inteligente e despachada, perguntou logo porque é que não haveria de ser para raparigas. Mas eu fiquei a remoer a coisa. Não deveria de ser uma mulher como aquela, uma "figura pública", a apoiar o fim de certos preconceitos e falhas de mentalidade da sociedade? Pelos vistos não. Pelos vistos para ela as raparigas tocam piano e fazem bordados. Não tocam bateria, não, isso não é coisas de meninas. Caramba, esta gente enche a boca para falar da igualdade de direitos e do fim do preconceito e da discriminação, mas quando é altura de darem o exemplo falham sempre. Morre o peixe pela boca, já dizia a minha avó...

10.10.09

Lisboa anti-pátria da vida*

Tenho uma teoria (que não interessa a ninguém, eu sei, mas que vou dizer na mesma) sobre Portugal. Eu gosto de Portugal, e por isso mesmo estou a estudar a sua história. Mas não gosto muito dos portugueses. São um povo estranho, sempre a queixar-se de tudo, sempre resignado. Vi no outro dia uma frase, atribuída a Júlio César, o imperador romano, que me pareceu fazer mesmo sentido: "Há, nos confins da Ibéria, um povo que não se governa nem deixa governar". Parece-me que é assim que os portugueses são.
E vem isto a propósito de Lisboa. Em relação a Lisboa tenho o mesmo sentimento que tenho em relação a Portugal, gosto do local, gosto das vistas e da luz, gosto daqueles sítios que nos tiram o fôlego, gosto das ruas estreitas e das grandes avenidas. Mas não gosto das pessoas.
Agora encontrei este texto. E voltei a sentir o mesmo. Eu gosto de Lisboa, gosto de todos os seus detalhes. E se calhar as pessoas não são assim tão más. Mas só se calhar.
*verso de Sophia de Mello Breyner Andresen

A "coutada do macho latino"

Eu tenho, digamos, um problema: tenho uma dificuldade enorme em entender as formas de pensar e agir dos homens. Simplesmente não consigo. Aquilo não me entro, como é que fazem tantas parvoíces, dizem tantas asneiras, será que não pensam de todo? É claro que há excepções; eu conheço algumas, poucas é certo, mas algumas. Mas eu pensava que isto era um problema meu, e como também não é uma coisa que me venha a fazer infeliz no futuro, vivia bem com a questão. Mas descobri que afinal não sou só eu que penso assim. Afinal há mais mulheres que não entendem uma boa parte das coisas que os homens fazem (quando as fazem) e dizem (quando não as "grunhem"). E essa informação chegou-me de uma pessoa por quem até tenho um certo respeito profissional, visto que é uma especialista na sua área e, estranhamente, também na minha. A pessoa em causa é Maria Filomena Mónica, especialista em sociologia e historiadora nas horas livres. E o texto em questão é este, publicado na Revista Única do Expresso da semana passada.
Neste texto a autora desenvolve a teoria de que os homens, apesar de terem evoluído (aleluia, mal de nós se assim não fosse), continuarem a ser extremamente, hum, falta-me a palavra, trogloditas, não é a palavra certa, mas por agora serve. Aquelas questões muito básicas da falta de higiene e assim. E agora vêm @s defensores e defensoras do sexo masculino dizer "mas os homens são limpinhos e agora até usam cremes e perfumes e coisas assim". Ora eu acho muito bem que assim seja, ainda bem que o fazem, só lhes fica bem. Mas experimentem ir a um sítio, seja em Lisboa ou na aldeia em que vivo, e olhar para 10 homens acima dos 45, talvez 50, anos. Façam esse exercício. E reparem nos detalhes. Reparem naquela unha com um comprimento absurdo no dedo mindinho; reparem nos pêlos do peito a serem exibidos, porque são sem dúvida uma prova da muita masculinidade e virilidade; reparem no barrigão de cerveja/ vinho/ outra bebida alcoólica qualquer, que se traduz, como é medicamente conhecido, num fígado que parece um bocadinho de couro ressequido. A sério, sou só eu que vejo estas coisas? Ando a delirar?

6.10.09

pensa no chão
na terra húmida calcada pelos teus pés
no passo para trás para te desviares
do vulto que não reconheces

pensa no silêncio
pensa na voz rouca que por vezes amas
pensa na solidão desse silêncio que te inquieta
na varanda escura que cresce para longe de ti

pensa na casa vazia
nos ruídos, na chuva a bater nos vidros da janela
pensa naquele sítio onde sabes que te podes esconder
a qualquer hora do dia ou da noite

agora não penses
porque casa pensamento é um minuto de vida que perdes
e já tens tão pouca para viver

Outubro de 2009

5.10.09

E eu que pensava que a pólvora já tinha sido descoberta...

Alguém, no caso uma psicóloga, de seu nome Vanessa Ramalho, decidiu fazer um estudo e torná-lo publico, sobre aquilo que já toda a gente devia saber, e que não sabem ou não pensam porque a sociedade portuguesa é tão atrasada que mete impressão: Homoparentalidade: estudo da adequação homoparental. Nesse estudo chegam à conclusão que os "os homossexuais, em geral, não são "neuróticos e ansiosos". Pelo contrário, são "afectuosos, tranquilos, confiantes e firmes nas decisões", características que fazem deles melhores pais do que muitos heterossexuais, mais "neuróticos, ansiosos e inseguros". Finalmente alguém descobriu que ser homossexual não é uma doença contagiosa, nem um distúrbio mental terrível, e que isso não nos torna maus pais e mães! Estava difícil!
Relacionado com esse tema surgiram também esta e esta notícias, assim como, para já, o comentário do Miguel Vale de Almeida.
Eu sei que estas coisas deviam de ser feitas no início do ano, mas como não se tratou de uma coisa planeada, e como sempre fui um bocado contra tradições, tomei uma série de decisões para a minha vida. Por influência de conversas com duas pessoas, uma a mulher que amo, com quem tenho falado sobre a minha vida e as mudanças que gostava de lhe fazer há bastante tempo, outra uma amiga de quem gosto bastante, e que decidiu ela própria reagir à resignação e ao marasmo da sua vida, comecei a ponderar fazer alterações, a princípio pequenas, mas que, espero, viram a ter uma grande importância no futuro.
A primeira decisão é deixar de fumar, coisa na qual tenho vindo a pensar há algum tempo, e que agora decidi que terá de ser definitiva. Acabaram-se as reduções, o "tenho de deixar de fumar um dia destes". Acabou e pronto.
A segunda é arranjar um emprego no próximo verão, que por motivos escolares vai ser mais longo, mesmo que esse emprego seja pesado e difícil.
A terceira decisão é poupar dinheiro, tanto da parte que gastava regularmente em tabaco, como desse possível emprego e de outros gastos que fazia e agora não faço, dinheiro esse que quero vir a utilizar no mestrado e/ou nos custos de um carro.
A quarta decisão é menos material e mais pessoal: deixar para trás uma série de mágoas e ódios de estimação, coisa que muito mal me fazia.
E quinta (porque agora não me lembro de mais), e esta vai depender muito da disponibilidade e vontade que tiver, é aderir a um projecto que me entusiasme verdadeiramente, e que neste momento teria um teor político.
E pronto, é um resumo das coisas que decidi. Pode ser pouco, mas é alguma coisa. É o princípio de mudar a minha vida e não me resignar ao que os outros me impõe.

30.9.09

Isto assim não dá

O meu semestre vai ter 3 meses, nos quais vou ter de dar a mesma matéria que há quatro anos atrás os alunos davam em 1 ano. Tenho um professor que sabe menos que os alunos e uma professora que se não ler os powerpoints não consegue dar as aulas. Chove dentro da escola mas a direcção preferiu pintar as paredes do que remendar o tecto. Andam todos maníacos por causa da gripe A, ao ponto de expulsarem professores dos seus gabinetes para os transformarem em salas de quarentena para pessoas contagiadas, mas ainda não se lembraram que se calhar termos de pegar em todas as maçanetas de todas as portas é uma forma de contágio (deixar as portas abertas dá muito trabalho, coitados, constipam-se com as correntes de ar nestes 30º). Como eu adoro o ensino superior público em Portugal...

25.9.09

O rei do bananal volta a atacar

Hoje acordei com a sensação de que o dia não me ia correr bem. E pelos vistos tinha razão.
Não é que, quando inocentemente vou dar uma volta pelos blogues do costume e pelas notícias mais recentes, dou de caras com isto? Grande parte da notícia é aquele senhor que é democraticamente eleito na Região Autónoma da Madeira de quatro em quatro anos, e já por lá anda há perto de trinta, a dizer as alarvidades do costume e a meter-se em assuntos que não lhe dizem respeito. Mas depois o dito senhor, que trato por senhor porque felizmente sou muito mais bem educada que ele e não ando por aí a insultar tudo o que me aparece à frente, sai-se com o seguinte comentário:
«Sublinhou que "votar contra Sócrates é ainda votar contra o casamento dos homossexuais". Apontando que "cada um é o que quer, mas não se pode chamar casamento àquilo que não é”, acrescentando que é uma “pouca-vergonha”. »
Por favor, expliquem-me, que eu sou muito burra e não entendo, o que é que ele tem a ver com este assunto? Ele por acaso pretende casar com alguém do mesmo sexo? Que eu, e o resto do país, saiba, não. Então não venha "arrotar postas de pescada", para usar uma expressão muito portuguesa, sobre coisas que não lhe dizem respeito. Porque se formos ver bem, pouca vergonha é o que ele diz cada vez que abre a boca.
Esta gentinha que tenha dó e não me venha estragar o dia com comentários tristes.

Eleições legislativas 2009

Hoje é o último dia de campanha eleitoral, da qual, diga-se de passagem, já estou mais que farta. Este ano o que se viu foi tudo menos campanha eleitoral: foi "votem em mim porque o outro é mau", foi ataques pessoais, foi insultos disfarçados, já para não falar de assuntos que não tinham nada a ver com as eleições mas que andaram na boca de todos os candidatos. Amanhã é o dia de reflexão, no qual, felizmente, é proibido fazer publicidade partidária, e domingo são as ditas eleições.
Agoram perguntam, "mas o que é que isso tem de interessante?". Pois bem, não tem nada. Escrevo isto só mesmo para dizer que tenho reparado na falta de vontade de uma parte da população, que eu deduzo pelos exemplos das pessoas com quem me relaciono. A classe política está profundamente desvalorizada, o que mais ouço na rua são comentários sobre o facto de todos os políticos procurarem apenas enriquecer e ganhar pessoalmente com as funções, em vez de se esforçarem para o bem comum. Isso é uma pena. Que as pessoas pensem dessa forma, e mais ainda, que essa seja a realidade.
Para estas eleições ponderei seriamente aderir ao conceito do Movimento Voto Nulo, por achar que uma boa parte das medidas propostas dos candidatos não passam disso mesmo, medidas propostas, e que nunca serão concretizadas (por aqui também se vê o meu próprio descontentamento com os políticos). Mas depois pensei que as eleições legislativas, se as virmos bem, não são para eleger um governo e um primeiro-ministro (ou uma primeira-ministra). São para eleger deputados, que representem a população e as suas ideologias e necessidades. Como a minha ideologia política é pouco moderada, pouco do centrão, eu nunca estaria, de qualquer forma, a votar num candidato para o governo. Mas estaria a votar num deputado, alguém para propôr medidas, quer elas sejam aprovadas pela maioria, absoluta ou relativa (ou mesmo pela coligação partidária), que saia destas eleições.
Mas o que eu não entendo, e acho que é provavelmente esse o motivo que me leva a escrever, são aqueles que se abstêm. Isto pode ser a minha visão de pessoa jovem que ainda pouca experiência tem nestas andanças, e que anda desejosa por pôr em prática o seu direito de voto (já para não falar em pessoa com muitos sonhos e ideias vagamente utópicas no que trata de política). Mas mesmo vendo por esse ângulo, não entendo. "Ah, não vou votar porque domingo vai estar bom e tempo e vale mais ir para a praia". Só podem estar a gozar comigo. Caso essas pessoas não se lembrem (e não devem lembrar, ou pior, não devem saber) votar não é só um direito. Votar é um dever civil, já para não falar de uma obrigação moral. Depois essas pessoas passam quatro anos a queixar-se das medidas tomadas pelo governo e pelos deputados da Assembleia da República, mas não têm direito nenhum de se queixar. Não votaram? Agora aguentem-se. Se tivessem ido votar talvez as coisas tivessem sido diferentes.
Por isso, se fazem favor, senhores e senhoras abstêncionistas, domingo levantem essa peida do sofá de casa, ou da cadeira da explanada, ou do areal da praia, ou seja de onde fôr, e cumpram a vossa obrigação como cidadãos.